Vídeo Rota da Seda

Praticamente um ano após o nosso retorno, finalmente terminamos o vídeo da Rota da Seda. Uma viagem da Turquia para o Curdistão e Norte do Iraque, Irã, Turcomenistão, Uzbequistão e Republica Karakolpak, Cazaquistão, Quirguistão, China/Xinjiang, Paquistão e Índia e Caxemira.

A ideia era fazer um lançamento em um telão, ou fazer uma reunião para a primeira exibição. Alguns fatores inviabilizaram isto no momento, e de qualquer forma, acredito que os leitores do blog devem ser os primeiros a ver.  Quem nos acompanha com frequência merece!

Espero que gostem…

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A diversidade da Índia!

A Índia não pode ser vista como um único pais, mas como vários países juntos. Cada estado e infinitamente diferente do outro. Nesta viagem mais do que nunca pudemos observar isto.

Era a terceira vez que viajava pela Índia, já tinha passado alguns meses no país, mas ao chegar na parte velha de Amritsar, me perguntei: Porque mesmo que eu gostava da Índia? E isto que o estado de Punjab era um dos que eu mais gostava, devido a deliciosa comida e hospitalidade do povo. Mas no primeiro momento o que sobressaia era um barulho ensurdecedor de buzinas, lugar cheio de gente e imundo. Não parecia ser a mesma Amristar que eu estive no ano passado. E não era, pois da outra vez, fiquei todo o tempo dentro do templo, inclusive hospedagem e refeiçoes  Passamos uma noite infernal com muito barulho, e no dia seguinte nos mudamos para um outro lugar mais calmo. Paz mesmo só conseguimos no Golden Temple. O Jony e Marco adoraram, foi um bom lugar para fechar a viagem deles. Era a primeira vez da Bibi ali também  e fomos todos comer no movimentado refeitório do templo. Bandeijão de qualidade, só o Jony que não encarou pois estava meio mal do estomago.

O Golden Temple e fantástico  não e um lugar para ser visitado, é para ser vivido. Sentar na beira da “piscina”, ver o entardecer e aprender mais sobre a cultura local com uma das pessoas que vai acabar parando para bater papo com você.

Nos despedimos dos “Idis”, que pegaram um trem para Agra, onde visitariam o Taj Mahal e voltariam para Delhi, para o voo de volta ao Brasil. No nosso dia de folga fomos tentar conhecer uma região da “Índia rica”, mas a rua tão falada, apesar de lojas internacionais, era imunda e cheia de vacas. Pelo menos a Bibi pode ir num bom salão.

Desde que saímos para viajar, alem da família (que veio), muitos amigos falavam que iriam nos visitar. Muitos gostariam, outros falavam por falar. Mas a Jami, grande amiga nossa, não se importou com uma recém transferência pela empresa para São Paulo, mudança de apartamento, e mesmo assim veio nos encontrar.

Ela nunca tinha feito uma viagem do nosso estilo, muito menos para algum lugar parecido com a Índia (se é que existe). Fizemos questão de busca-la de autorickshaw e foi muito legal ver a cara dela pelo caminho ate a cidade. Desde o inicio ela já quis conhecer as comidinhas, andar pelas ruas secundarias, e tive certeza que seria uma ótima companhia de viagem. Se emocionou no Golden Temple, fez amigos, foi com a Bibi na cerimonia da fronteira (desculpem mas eu sou Jula, Jula Pakistan!haha).

Qualquer viagem pela Índia não esta completa sem uma experiencia com os trens. Pegamos um trem para Jamu, capital de verão do estado Jamu & Caxemira. E chamada de cidade dos templos. Se em Amritsar a religião predominante era dos Sikhs, em Jamu é o Hinduísmo  Na frente dos templos tinham grandes barricadas, com arame farpado e exercito. O clima não era muito amistoso, e recalculando os dias que a Jami ficaria na Índia, decidimos não ficar muito tempo ali. Uma forte tempestade a noite, queda de energia, e trovoes que acordaram a Bibi, achando que eram bombas haha. Demos umas voltas, comemos num gostoso restaurante, e estávamos preparados para encarar a estrada até Srinagar.

Estrada longa, cheia de curvas e temperatura caindo com o passar do tempo e com a subida. Muitos Gujards no caminho, povo pastor nômade, que ocupava parte da estrada com suas criações.

Depois de muitas horas de viagem, entramos num túnel estreito, escuro, com 2,5 km de comprimento. Logo na saída do túnel uma placa: “Bem vindos a Caxemira, o paraíso na terra.” Ao fundo uma vista para o magnifico vale, com arvores, plantações  flores e rios. Espetacular!

Passamos por pequenas vilas, e já observamos mulheres com véu cobrindo o rosto. Agora estávamos em região muçulmana.

Chegando em Srinagar, nosso plano era de ficar num hotel uma noite, para no outro dia bem cedo ir procurar e comparar os barcos-casas do lago Dal. Acontece que os caxemirianos são ótimos negociantes (para o lado deles) e acabamos cedendo de ir conhecer um barco-casa oferecido, e nos demos super bem!

Os barcos de luxo ficam bem perto da avenida, tem bastante barulho, alem de insistentes vendedores passando de shikara (canoa local) oferecendo coisas. O nosso era meio decadente, mas bem acolhedor. Ficamos mais afastados, num lugar tranquilo, para dentro do lago, cercado de flores de lótus.

Ao contrario dos barcos de Aleppey, que navegavam todo o tempo, os de Srinagar ficam ancorados. Para se conhecer o lago e todo o “waterworld” só de shikara. Pensamos em fazer um passeio curto, no máximo de duas horas, mas foi tao legal que nos empolgamos, e ficamos umas cinco horas explorando os canais, passando por mercados flutuantes, as vilas sobre palafitas com o dia a dia sobre as canoas. Um passeio fantástico,  belíssimo !! Existem shikaras simples, mas muitas delas são todas preparadas para passeio, com almofadas e encostos. Tem uma infinidade de shikaras por todo o lado e quase dois mil barcos-casa. A região já foi muito turística  mais devido ha algumas guerras e frequentes conflitos, as pessoas passaram a ter medo de viajar por lá. Este ano teve um boom de turismo, dos próprios indianos, e saiu reportagem ate no NY Times (clique aqui).

flores de lotus

Shikara

Barco casa

equipe!

A Caxemira é mais uma daquelas questões polemicas. Na divisão do subcontinente indiano, os ingleses previam só dois países  um hindu (Índia), outro muçulmano (Paquistão). Nisto Punjab (Sikh) ficou chupando dedo, e Caxemira também  A Caxemira era de maioria muçulmana  mas tinha um Marajá hindu, colocado pelos ingleses. Na época da divisão  ele ia optar pela Índia (talvez até tentaria uma impossível independência), e por isto foi invadido pelo Paquistão  No final da historia ficou 1/3 com o Paquistão e 2/3 com a Índia. No tratado de paz da ONU, teoricamente a população que deveria ser ouvida para definir quem teria direito sobre a Caxemira. Claro que a Índia nunca aceitou esta decisão.

Isto não quer dizer que todo mundo gostaria de ficar com o Paquistão,  muito pelo contrario. Conversando com um estudante universitário  que participa de protestos pacíficos  ele me disse que 70% dos caxemiris querem ser um país independente ( e acreditam que um dia vão conseguir), 25% querem ficar com o Paquistão (a maioria destes são de pequenas vilas) e apenas 5% querem ficar com a Índia (ricos comerciantes de olho na economia indiana).

A Índia está apostando muito na ocupação da Caxemira, e é fácil de ver. Na estrada até lá é muito comum se ver comboios de caminhões com milhares de soldados. Muitos postos de controle e soldados por toda a cidade. Isto quebra um pouco o charme do lugar, mas existem algumas “ilhas” de tranquilidade.

A cidade velha de Srinagar é uma delas. Tranquilidade por causa da ausência do exercito, não pela falta de bagunça  O exercito não vai muito lá, pois os locais se reúnem e jogam pedras neles, e sempre da confusão  muitas vezes tomando grandes dimensões  As ruas são muito estreitas, e as casas possuem uma arquitetura única. Muitas delas com sacadas em madeira toda trabalhada. As mesquitas também tem um estilo próprio  sem minaretes, e com o telhado lembrando estupas budistas. Fomos diversos dias nos perder pelas ruas. As grandes atracões  não tem endereço certo, elas são as cenas do cotidiano. Lojas de especiarias, carneiros sendo pendurados e carneados no meio da rua e por ai vai. Em volta da mesquita principal aquela sensação de que o tempo parou. Diversas pontes cortam a cidade e dão uma vista fantástica para as construções.

Notamos um templo hindu todo cercado por arames, e ao olharmos curiosos por algum tempo, soldados nos convidaram para entrar. Fizeram uma base militar ali. Estrategicamente protegiam o antigo templo, e controlavam uma ponte bem em frente, que dava acesso para o miolo da cidade velha.

Outro grande refugio são os jardins Munghals. Uma dinastia descendente dos mongóis persas, que dominou boa parte do sul da Asia. Existem diversos jardins, todos floridos, muitos deles com vista para as montanhas ou para o lago Dal.

Jardins

Na noite anterior a nossa partida, mudamos os planos. Fomos convidados para um casamento e não poderíamos perder esta oportunidade. Na verdade tiveram três casamentos bem perto da nossa casa- barco. Os casamentos demoram dias, e fomos acompanhando os barcos chegando com as decorações  os mais de 30 carneiros mortos, e todos os vizinhos passando horas preparando a comida. Musica ja de dia, a noiva tendo sua mão pintada com henna, muita comida e festa ate de manha! Bem de madrugada distribuíram cobertores e todos ficaram largados no chão enquanto um homem vestido de mulher fazia um show de musica e dança  brincando e provocando os convidados estilo Nei Matogrosso. Nos divertimos muito quando ele tirou a Jami e a Bibi para dançar!!! Demais! Um grupo de músicos tocou a noite inteira e tinham narguilés por todos os cantos.

os preparativos

A noiva

A festa

Quando madrugamos para pegar transporte a musica ainda estava rolando, e ainda teria mais um dia de festa ate o noivo chegar para buscar a noiva. As festas são separadas.

Sabíamos que a viagem seria longa, mas foi ainda mais demorada que o esperado. No total acho que passou de 17 horas viajando pelos Himalaias, passando pelas milhares de curvas, no topo de altíssimos passes com vistas espetaculares. Paramos em Kargil, cidade bem próxima a linha de controle, onde os paquistaneses invadiram a pouco tempo, mostrando que os milhares e milhares de soldados indianos talvez não estejam tao preparados quanto pensam. Na estrada vários acampamentos do exercito, muitos deles fazendo treinamentos de escalada nas montanhas. Saindo da região da caxemira entramos em Ladak. A paisagem ia ficando mais desértica  pois estávamos cada vez mais altos. As bandeirinhas de orações budistas passaram a aparecer por tudo que ‘e lado, e as vilas estavam cheias de estupas e monges. Paramos em algumas delas, e gostaríamos de ter podido ficar mais tempo por ali. Chegamos já bem tarde em Leh, e por acaso acaso acabamos ficando numa pousada super bacana. Tinha um jardim todo florido com vista para as montanhas de um lado, e para monastérios e fortes do outro.

A caminho de Leh

Leh fica a mais de 3500 metros de altitude. Confesso que devido a dificuldade para chegar, esperava um lugar mais intocado. Sabia da fama do lugar entre os viajantes, mas não esperava tantas lojas uma perto da outra e restaurantes vendendo pizza e comida ocidental. No meio de tudo isto muitas internet cafés. Por outro lado, a energia elétrica faltou com muita frequência  mostrando que ainda existe um certo isolamento.

Chegamos para o ultimo dia do festival de Ladakh, onde teria musica, dança  alem das apresentações com mascaras. A partida de polo tinha sido ha dois dias, e perdemos novamente. O final do festival, mostra o termino da temporada. A partir de agora, pode nevar nos passes mais altos. Os viajantes overland saem as pressas sentido Manali (22 horas de estrada terrível , e era para Leh estar tranquila. Mesmo assim acho que vimos mais turistas do que monges.

Na cidade tem um bonito palácio real, um forte com uma super vista para o vale, alem de uma cidade velha e diversos monastérios  mas o mais interessante mesmo esta nos seus arredores.

Partimos para as montanhas, caminhando entre vales e bonitas formações rochosas, atravessando rios ate a vila de Rumbak. Uma vila de não mais que 12 casas e um monastério  Muitas plantações  yaques, e um grande espirito comunitário  Região muito bonita, um vale realmente especial. Passamos a noite numa das casas, fomos super bem recebidos. Aproveitamos um monte o lugar, mas na hora de seguir viagem fui voto vencido. Seriam mais 8 horas de caminhada, desta vez passando a 5 mil metros de caminhada. Acabamos voltando pelo mesmo caminho, e encontramos um casal de espanhóis viajando com seu filho de 3 anos. Iam fazer um treking de 25 dias!! Já era o oitavo pais que o moleque conhecia, e sempre ia caminhando, com seu óculos espelhado e todo animado. Pra quem acha que não da para viajar com criança ta ai:

Quem disse que não da para viajar com

criança

A tal da Delhi-belly acabou atrapalhando nossos planos. Não conseguimos explorar tanto a região como gostaríamos  mas fizemos o que pudemos. Se tínhamos chegado um dia depois da partida do nosso amigo Koich, por outro lado acabamos encontrando novamente os franceses la do Paquistão.

Depois de tantos meses viajando pela rota da seda (que também passava por aqui), pegamos o primeiro avião  Daria para seguir por terra, mas isto mostrava que o tempo estava acabando, e nossa viagem também  No pequeno aeroporto parecia uma operação de guerra, com centenas de soldados, burocracia e segurança. O voo foi rápido, com uma super vista de montanhas pela janela.

Em Delhi decidimos não ficar no Pahaganj, barulhento “ camelódromo” onde fiquei nas outras viagens. Ficamos no Manju ka tilla, bairro tibetano, um pouco mais afastado mas bem mais calmo.

Como era a primeira vez da Jami em Delhi, fomos em diversos lugares, muitos deles que eu só tinha ido na minha primeira viagem a Índia em 2005. Foi muito legal, ate porque hoje sou uma pessoa diferente, e vejo os mesmos lugares de forma diferente. Sem contar que e muito legal a cara de alguém que esta andando de rickshaw pela primeira vez pelas ruas de Old Delhi. Comemos no indicado restaurante Karim, fomos ver filme em hindi e não demorou ate nos despedirmos da Jami. Ela foi uma super companheira de viagem, pegou bem o espirito da coisa.

old Delhi

Já estava chegando nossa hora também  mas depois de tanto viajar, acho que merecíamos umas ferias da viagem, um pouco de “ descanso”. Se a rota da seda tinha chegado ao fim, tínhamos que pensar em alguma outra coisa…

Jeevay, Jeevay, Pakistan!!

Rawalpindi fica ao lado da moderna capital Islamabad. Rawalpindi é a parte movimentada, viva da cidade. Rodamos os bazares  tentamos visitar o local onde pintam os caminhões  mas estava tudo fechado. Era o ultimo dia de Ramadan. Se todos iam festejar, nos também fomos. Pegamos um autoricksha ate Islamabad. Cidade planejada, com avenidas largas e rápidas  Bem estilo Brasilia. Alguns bairros com muitos casarões mostravam a parte rica do Paquistão  que ainda não tínhamos conhecido. Demoramos um pouco para achar a casa de carnes que procurávamos  mas valeu a pena. Estava muito bom!!! Demos uma volta pelo shopping, que era todo no térreo  todo espalhado. Na volta passamos para ver a mesquita Sha Faisal toda iluminada e pegamos um engarrafamento interminável  Tava todo mundo na rua, tinha iniciado o Eid al-Fitr, feriado depois do Ramadan, onde se come durante dias!

Cabine do caminhao

Mesquita sha Faisal

Ficamos receosos de não conseguir transporte para Lahore neste período  mas acabou dando tudo certo. Não foi com a melhor companhia de ônibus  mas na beira da estrada conseguimos parar para comer alguma coisa. A estrada não era boa, era excelente, mas o calor estava infernal. Para ajudar, nada de ar condicionado nem das janelas abrirem. Chegamos fácil no hotel que pretendíamos ficar, mas era um pulgueiro. A segunda opção estava fechada e depois de bater bastante a cabeça  acabamos apelando para o “eu mereço . Pegamos um hotel bom, numa região mais tranquila, e que acabou nem saindo tao caro. Ok, para os preços que estávamos pagando era caro, mas em reais ainda era bem barato. Se para mim o “eu mereço”  não cola, o “paguei para minha tranquilidade” me consola haha!!! Acabou sendo um refugio. Tava muito quente, e com o feriado, as ruas estavam lotadas. Fomos no belo forte da cidade, na imponente mesquita Badshahi. Falamos com muitas pessoas, e tiraram bastante fotos de nos. Chegamos perto da mesquita Wazir Khan, no meio de uma confusão com autorickshas, carros, cavalo, camelo e crianças brincando e muitos vendedores. Musica alta, buzinas, um verdadeiro caos. Todos queriam correr para o hotel, mas ainda me acompanharam para ver a decadente, mas muito bonita mesquita. Também nos surpreendeu o numero de igrejas em Lahore. Muitos cristãos vieram farar com a gente e dizem ter uma vida super tranquila. O conflito entre Sunistas e Xiitas e bem maior que o de Muçulmanos e Cristãos   Em Lahore tem o bairro descolado de Gulberg, que no fim das contas acabamos não indo, mas quem quer um restaurante tipico simples mas muito bom, recomendamos o Tabaq, que passou no teste com louvor!!!

Forte de Lahore

Mesquita Badshahi

mesquita Wazir Khan

Um programa que nao podia faltar era ver a retirada da bandeira na fronteira com a India. Eu e o Marco compramos camisetas da seleção de cricket especialmente para a ocasião  A fronteira não fica longe, mas com o feriado tava todo muno na rua, então demorou bastante. Chegamos e as arquibancadas estavam lotadas. Homens para a direita, mulheres para a esquerda. Como estrangeiros teríamos acesso a tribuna de honra. Entramos pela rua, entre as arquibancadas, como se fosse uma passarela. Quando fomos notados a multidão foi se levantando, todos com sorrisos no rosto, gritavam aleatoriamente e tiravam fotos. Quase simultaneamente o Marco tascou um beijo na camiseta do Paquistão e eu acenei para a galera levantar. O barulho foi ensurdecedor, parecia um gol na final de campeonato. AaaAAAAAHHHHH!!!! Com o braco para cima e punhos cerrados, puxamos um Pakistan, Pakistan que ecoou por minutos. Os indianos do outro lado do portão não entendiam o que estava acontecendo, pois o show ainda não tinha começado  Logo vieram os “Pakistan, zindabad!” (vida longa ao Paquistão).

Torcida masculina

Torcida feminina

Logo iniciou o desfile, os gritos e provocações. Ano passado tinha visto do lado indiano da fronteira (Clique aqui), e comentei que estava chateado de não seguir por terra para o Paquistão e Ira. Mal eu imaginava que faria o caminho contrario (na verdade um pouco mais longo) e colocaria estes dois países na lista dos meus favoritos. Se na India achei o show um pouco longo, este participamos como verdadeiros paquistaneses. As diferenças do show em si são bem pequenas. Basicamente do lado indiano tem danças  e no paquistanês animadores de torcida e tambores. Com o final da cerimonia, filas de pessoas se formaram para falar conosco e tirar fotos. Fomos celebridades muito simpáticas e atenciosas, atendendo a cada pedido. Só os pedidos de homens tirarem fotos com a Bibi eram negados. Eu sempre falava rindo, vocês deixariam eu tirar fotos com a tua mulher, irma ou mãe haha?! O guarda teve que pedir para sairmos, pois só estávamos nos e nossos “fãs”. No caminho ate o carro a cena se  repetiu dezenas de vezes, e famílias inteiras pediam para tirar fotos. Com o feriado muitas pessoas de pequenas vilas ou cidades distantes estavam ali. Encontramos com os franceses e acabamos indo jantar juntos. Tivemos discussões calorosas sobre o respeito a cultura local e diferenças entre ocidente e oriente.

Pakistan!

Volta para Lahore

posamos para fotos e mais fotos

Na manha seguinte acordamos cedo e fomos para a mesma fronteira. Desta vez não para ver nada, mas para atravessar para a India. Não tinha uma alma, estava completamente vazia. Isto não fez com que o processo fosse agilizado. No balcão um jornal dizia que três soldados paquistaneses tinham sido mortos sem motivo em uma das fronteiras com a India. A relação entre os dois países realmente não e nada amigável  Caminhamos entre as arquibancadas vazias, nos despedimos de soldados que participaram da cerimonia no dia anterior, mas que estavam cumprindo o dever naquele dia. Do outro lado já não foi mais rápido   Não que tenha demorado um monte, mas não tinha ninguém, poderia ter sido mais rápido  Saindo da imigração ofereceram uma cerveja e o Marco aceitou, pois estava ha um mês sem beber nada . Na verdade em Lahore um senhor deu alguns copos de wiskey (ilegal, portanto caríssimo  para ele depois de um papo rápido na rua. O rapaz da cerveja voltou, e cobrou três vezes o preço oficial marcado na garrafa. Caiu a ficha, estávamos na India!

KARAKORAM HIGHWAY (KKH)

Karakoram Highway e um daqueles lugares que merecem ser escritos com letras maiúsculas  São 1200 km, ligando Kashgar ate quase Islamabad. O inicio da construção da estrada começou no final dos anos 60, mas a estrada só ficou pronta 20 anos depois. Pronta? Na verdade ela nunca vai ficar completamente pronta. Assim como na transamazônica  a natureza busca recuperar o território perdido, e se não fizer grandes manutenções anuais, a estrada desaparece.

A Karakoran passa entre algumas das maiores cadeias de montanha do mundo. Montanhas de 7 mil metros tem por todos os lados e com mais de 8 mil, não são raras. Foram construídas mais de uma centena de pontes, e a obra custou a vida de outras centenas de pessoas. A estrada só fica aberta pouco mais de quatro meses por ano. Devido a sua altitude, grande parte dos passes ficam totalmente cobertos de neve. No verão não existe garantia de poder viajar por ela dentro de um horário programado. Os deslizamentos de pedra são muito comuns, e numa estrada entre as montanhas e penhascos, não existe uma segunda alternativa…

KKH

Após avistarmos a primeira bandeira do Paquistão  no passe Khunjerab, a quase 5 mil metros de altitude, iniciou uma descida espetacular em zigue-zague. Nem dava para notar que tínhamos entrado na mão-inglesa, pois a estreita pista (teoricamente de duas mãos) era ocupada completamente pelo ônibus  Para fazer as curvas, não foram poucas vezes que tiveram que dar a re. Ao longo do caminho, alguns trabalhadores tentando recuperar a estrada, mas com picaretas e pás… Parecia obvio quem seria o vencedor da batalha homem x natureza. Algumas vezes tivemos que parar o ônibus para retirar pedras que rolaram no meio da pista. Para viajar por aqui, deve-se esquecer o numero de km que se vai percorrer. A contagem deve ser em horas, não em Km. Mas em plena Karakoram, eu não tinha nenhuma pressa em chegar! Passávamos por montanhas incríveis, penhascos assustadores, e por dezenas de glaciais.

Glaciais na beira da estrada

tinha uma pedra no meio do caminho…

Já estávamos enturmados no ônibus. Um senhor de Peshawar (carinhosamente apelidado por nos de Osama) me adotou, e ficamos conversando um tempão  Me convidou para ir a sua casa, deu o telefone e pediu para tirarmos fotos juntos. Numa parada na entrada de um parque nacional, aproveitamos para esticar um pouco as pernas, e o motorista para trocar o pneu furado. Chegamos na pequena, mas movimentada, Sost. Já viajávamos há muitas horas no Paquistão  mas só agora a imigração seria feita. Oficiais mega simpáticos  tiramos nossos vistos no meio de muito bate papo e declarações de “ Sejam bem vindos ao Paquistão”.

Jonny no meio da confusão de quem não pagou o 

ônibus

Eu, “osama” e amigos

A cidadezinha em si não tem nada de mais. Só a rua principal, com hotéis simples e restaurantes. Cidade de fronteira, né. Mas foi nosso primeiro contato com os caminhões do Paquistão  São todos decorados, tunados, muito estilosos!! Procuramos um hotel por ali, mas descobrimos que tinha uma parte antiga da cidade, ha poucos quilômetros da onde estávamos  Não pensamos duas vezes antes de fugir do barulho. Lugar simples, mas com uma vista sensacional!! Um casal de espanhóis nos acompanhou. Acabei nem comentando, mas no nosso ônibus tinha cerca de 10 estrangeiros. No caminho para Sost velha conhecemos um Sr. Tcheco (que era uma figura) que também foi junto com agente.

Vista de Sost velha

Quem quer viajar pela KKH tem que acordar cedo, ou se não, arcar com os custos de um transporte particular, comprando todos os lugares. Depois de uma longa viagem não acordamos cedo o suficiente, mas como não eramos poucos, conseguimos arranjar um transporte ate nosso próximo destino, Passu.

Passu e outra vila cortada pela KKH. Para chegar ate la, mais montanhas, pontes, precipícios  glaciais. Nosso hotel ficava bem de frente para montanhas pontiagudas. Queríamos sair para fazer umas caminhadas curtas pela região  mas o tempo fechou e tivemos que ficar no hotel mesmo. Restaurante bom, o pessoal comeu, e aprovou, carne de yak pela primeira vez. Eu já tinha comido no Tibet, e sabia o que esperar. Alguns paquistaneses e uma inglesa estavam no mesmo hotel, e ficamos conversando bastante, trocando informações e pegando dicas. Não sabíamos se o tempo ia melhorar, então acabamos seguindo com eles mais para leste, nos afastando da KKH. Há poucos km de Passu um posto de controle, onde tivemos que deixar todos nossos dados num livro. Rotina que foi muito comum pelo Paquistão. Trocava de município, novo registro era feito.

A estrada ate Shimshal tem só 50 km, mas demorou 18 anos para ficar pronta. Tiveram que cortar a rocha das montanhas para poder passar um jipe. Algumas horas de viagem, por curvas e precipícios de dar um frio na espinha. Alguns dos glaciais que passamos tinham mais de 60 km de comprimento! Muita poeira, e outros glaciais ficavam totalmente negros. Atravessamos pontes suspensas, rios, e chegamos na vila, que parecia um verdadeiro oásis no meio das montanhas.

estradas para Shimshal

Toda a região norte do Paquistão era completamente isolada antes da construcão da KKH. Claro que existiam caminhos antigos, onde os viajantes passavam de camelo, burro e cavalo, mas eram viagens muito longas. Era o braco da rota da seda que ligava a India. Em toda esta regiao existiam diversos reinados independentes, ate 40 anos atras. E possível verificar as diferenças ate hoje. Língua  etnia, costumes e tradição mudam de um vale para outro. Shimshal e toda de pedra. Os muros para proteger as plantações de verão dos animais estao fortes e firmes há não sei quanto tempo. E uma viagem no tempo. O povo e Gojal, muito simpóticos, descendentes de Tajiks.

Gojal faces

Ficamos numa casa tradicional de um Sr muito gente boa. Nesta região eles são muçulmanos ismailis (uma ramificação dos Shiitas), e não jejuam no Ramadan. Pedimos logo um prato tipico. Veio uma gororoba que não foi muito bem aceita. O tiozinho ficou meio assim com quem não comeu, e virou meu melhor amigo depois de eu limpar três pratos. Depois, nas outras refeições fui sempre o primeiro a ser servido.

Caminhamos pela vila, subimos em pequenas montanhas entre o bem feito processo de irrigação  para ter uma vista melhor do lugar. Fantástico  A noite caiu, e num lugar sem energia elétrica não preciso nem descrever como estava o céu, né?!

Shimshal

Muita conversa, mais informações  historia, comida (as próximas foram apreciadas por todos), caminhadas e estávamos madrugando para pegar o transporte de volta para Sost. O jipe de comunidade sai lotado, e nos enfiaram no meio. Horas chacoalhando, esmagados, com descida somente para atravessar rios gelados, quase arrebentaram com os joelhos dos Sopranas.

Ventava muito em Sost, e cancelamos a caminhada entre os dois grandes glaciais da região  Mas como eles não eram longe, são na beira da estrada, almoçamos na frente de um deles. Depois nos dividimos, Jonny e Bibi voltaram para o hotel, e eu e o Marco decidimos enfrentar o tempo ruim, e caminhar ate a ponte suspensa. Não e muito longe, mas o vento era forte, e a probabilidade de chover grande. Contornamos montanhas, por caminhos bem estreitos, quase sempre ao lado do rio (muitos metros acima, e claro). Já nos questionávamos se estávamos no caminho certo quando vimos alguma coisa. Parecia só uma corda indo de um lado ao outro do rio, mas alguém atravessava, com comida para os animais nas costas, então tínhamos certeza que estávamos perto.

Passu

A ponte foi carinhosamente apelidada de “ponte do Indiana Jones”. Existia um espaçamento bem considerável entre uma tabua e outra, e balançava muuuito. Ficamos nos divertindo um bom tempo, atravessando de um lado ao outro, parados no meio sem as mãos, tirando fotos, ate que a chuva veio. Chuva fina, quase não atrapalhou. Voltamos tranquilos, vendo as montanhas por outro ângulo, descobrindo novos glaciais. Fizemos uma parada na vila para pegar informação sobre o transporte e tivemos noticia sobre uma greve. Há dois anos houve um grande deslizamento, praticamente uma montanha desabou bloqueando o rio, e formando um grande lago, interrompendo a KKH. O governo não tem tomado atitudes sobre o caso. Muitas pessoas perderam suas casas, e milhares ficaram isoladas. Houve um protesto violento (ok, não tanto quanto o de Londres), mas queimaram um ou outro prédio publico e duas pessoas morreram. Depois do episodio a policia fugiu e os barcos pararam de funcionar no lago, unica ligação até o outro lado da KKH.

Fizemos diversas “ reuniões”, e decidimos que deveríamos atravessar o lago assim que pudéssemos  mesmo que para isto tivéssemos que pular o Lago Borit e a vila de Gulmit. Não poderíamos correr o risco de ficar isolados em Passu, mas também não poderíamos seguir caso os protestos continuassem. Era esperar para ver.

Ao acordar deixamos as mochilas prontas, e ficamos só esperando a informação chegar. Estávamos na beira da estrada, então seria fácil de ver o movimento caso estivesse liberado. Recebemos informação de que liberou, depois outra dizendo que não. Mudamos os planos umas cinco vezes, ate que um carro veio do sentido contrario. Tinham acabado de passar, e confirmaram que os protestos acabaram. Era a informação que precisávamos  de alguém que esteve por la. Os transportes passavam lotados, e quando digo lotados, ‘e com algumas pessoas no teto. Encontramos um amigo nosso que nos levou ate o barco por um preço local.

La chegando tinha uma família que estava fretando um barco,  fomos juntos navegando entre as montanhas. Pena que o tempo estava fechado. Dava para ver que a agua era transparente, e se tivesse sol estaria tudo azul. Um Sr. foi apontando onde estavam as vilas, hoje submersas, e listando o numero de casas e vidas que foram perdidas. Muito triste, e fácil de entender os protestos pelo descaso do governo.

parte onda a KKH foi interrompida pelo lago

Depois de um bom tempo, chegamos a terra firme, no exato lugar onde o rio foi bloqueado. Pegamos um jipe, que mesmo com 4×4 parecia não vencer as ladeiras de barro na beira dos precipícios  Preciso descrever como era a estrada a partir dali? Logo chegamos no Vale Hunza. Não ficamos na beira da estrada desta vez, mas bem para cima, com uma super vista, em Karimabab.

O magnetismo da Índia.

Já estava tudo decidido, passagem comprada para nossa próxima etapa da viagem. Mas paresiamos não estar prontos. Já fazíamos planos de retorno para cá, e as viagens que imaginávamos não eram curtas, teriam pelo menos 2 meses, sem repetir os lugares que mais gostávamos. Estávamos cansados, física e mentalmente, mas deixar a Índia não era fácil. A Bibi levantou a possibilidade de adiarmos a passagem e eu topei na hora, afinal parecia fácil só trocar a data. Comprar uma passagem na internet é fácil, se já tiver pesquisado preços não demora mais que dois minutos. Fiquei surpreso ao saber que a troca não poderia ser feita pela internet, somente pessoalmente em um dos escritórios. Verifiquei a lista de escritórios mais próximos, e decidi ir pra Chandigarth, que já seria meu caminho para Daransala. A Bibi voltou para o Ashram. Na saída do hotel tentaram cobrar uma noite a mais. Como existe todo um controle de segurança, e preciso preencher varias papeladas. O recepcionista preencheu tudo, e só assinamos, com a data errada. Quase caímos no golpe deles, mas não parecia logico. Recorri ao meu diário para verificar as datas, mas estava desatualizado. Depois de muita conversa, lembrei que no ultimo dia do Ashram tínhamos tirado varias fotos, e estas tinham datas. Mostrei para o gerente do hotel, e quando este disse que minha maquina devia estar errada vi que era golpe mesmo. Mais uma longa discussão e falaram que poderíamos ficar mais uma noite mas que não devolveriam o dinheiro. Mais empenho e conseguimos os trocados do valor que tinham cobrado a mais. O hotel era muito barato (e bom!!) mas não era uma questão do dinheiro, e sim do mérito.
Umas cinco horas depois (viagem curta para padrões indianos) eu estava chegando em Chandigarth. Falavam muito desta cidade, já que foi toda planejada por um arquiteto francês, alem de ser muito verde. Teoricamente uma digna representante da “nova Índia” toda descolada. Acabei não podendo conhecer muito da cidade, pois logo descobri que o escritório listado no site não existia mais. Liguei para o escritório de Nova Delhi, e me recomendaram ir para Jallander. Achei que era ali perto, mas la se foram mais umas quatro horas. Não cheguei a tempo de ir no escritório, e ficou para o dia seguinte. Foi muito difícil de achar hotel, cidade comercial, estava ou muito caro ou lotado. Acabei arrumando um quarto não muito agradável atras de um estacionamento de bicicletas e triclishaws. Desespero deu ao saber que o escritório não abria aos sábados, e que fiquei esperando la na frente de bobeira!!!. Pelo menos estava perto de Amritsar, cidade que estava nos meus planos, então teria só que inverter meu roteiro. Desci da rodoviária e atravessei a rua para almoçar no primeiro restaurante que vi. Comi um delicioso Punjab Thali, comida da região. Segui ate o Golden Temple onde pretendia me hospedar. Como era aniversario do Guru Arjan Dev, um dos principais gurus dos Sikhs (religião do local, onde o Templo Dourado e o principal local de peregrinacao), tava muito lotado, e não consegui quarto no primeiro dormitório que busquei. Em volta do templo existem vários dormitorios para os perigrinos e tentei outro (Guru Ram Das Sarai), onde consegui um colchão no chão para a primeira noite, mas me prometeram cama para as demais. Queria ficar entre os indianos, mas para manter a ordem e a reputação, fui colocado junto com outros estrangeiros em um grande quarto.
O Sikhismo e uma religião derivada do Hinduismo, mas com diferenças bem marcantes, como o culto a somente um Deus e ser totalmente contra o sistema de castas. Na verdade o Guru Nanak, fundador da religião era um grande pensador, viajou por toda a India, Tibet, Ceilao (atual Sri Lanka) passando pela Pérsia (Iran) e visitando inclusive Meca, na Arabia. Depois de mais de 40 anos ele retornou e fundou a religião, que contem vários aspectos e influencias do Islamismo também. Há quem considere a religião uma especie de filosofia, já que qualquer Deus pode ser louvado em um templo Shikh. Inclusive grandes lideres Sikhs no passado construíram mesquitas, para que a população islâmica da região pudesse seguir sua devoção. Religião bem tolerante e com um aspecto interessantíssimo. Segundo ele, uma pessoa não consegue pensar em Deus se tiver com a barriga vazia, com isto criou as Langars, cozinhas comunitárias, que fornecem alimento gratuito nos templos. O prédio onde ficava meu dormitório era bem perto da gigantesca cozinha/refeitório, e de uma das entradas. Caminhei pelo templo mais de uma duzia de vezes. Bati papo com o pessoal, tomei banho no lago de noite, quando tudo estava mais calmo. Sim de noite, pois fica aberto 24 hs. O bom da proximidade e que já sai descalço, sem ter que se preocupar em deixar o chinelo nos guarda sapatos, ou enfrentar fila.

Golden temple!!

 

Olha o estilo

Ao entrar no templo tem que lavar os pés, e já providenciam uma área transversal ao caminho com água. Homens e mulheres tem que cobrir a cabeça. O templo propriamente dito fica no meio de um lago, onde filas se formam para a visita. Mas ao redor existem outros lugares sagrados e a vista e fantástica, principalmente final de tarde quando o sol esta se pondo e o céu fica dourado, como se o templo estivesse refletido; e a noite, quando fica tudo iluminado. Em alguns horários do dia existe uma procissão com o livro sagrado, e a limpeza do local, um mutirão com todos os devotos ajudando e muito interessante.

Templo dourado com céu dourado!!

 

Todo mundo ajudando a lavar o chao

Para mim a cozinha e algo a parte. Funciona 24 hs por dia, servindo milhares e milhares de refeições. Eu calculei algo entre 50 e 100 mil refeiçoes diárias neste final de semana movimentado. Tudo na base do mutirão, fieis ajudam a lavar as bandejas, cortar cebola e por ai vai. Filas se formam para entrar nos gigantescos salões, onde as pessoas vão se acomodando no chão em estreitas fileiras. De tempo em tempo fecham a porta para uma limpeza geral, para só depois liberar a entrada de novas pessoas.

Fila para o rango!!

 

Milhares de refeições gratuitas

Existe uma área separada só para o chai. Fantástica a logística, organização, limpeza. Ótimo lugar para conhecer pessoas interessantíssimas e aprender mais sobre a cultura deles. Alguns aspectos interessantes, como que para os olhos de Deus, tanto um eremita na caverna como um príncipe no palácio estão em igualdade, pois tem funções diferentes (não estimulando a renuncia e desapego por exemplo). Coloca o principal aspecto de Deus no homem e não nos livros e leis.
Punjab, estado desta região, almejou durante muito tempo ser independente. Tentou algumas vezes, mas nunca obteve sucesso. A ultima delas foi em 1984, quando os separatistas foram encurralados no templo dourado, onde foram massacrados e bombardeados. A Indira Gandhi, que ordenou a invasão pagou caro por isto pouco tempo depois, ao ser assassinada pelos 2 seguranças particulares Sikhs.
A região tem uma cultura muito forte, musica, comida, os turbantes, espadas e lanças, que fazem parte da tradição. Povo muito acolhedor e simpático, fez com que me sentisse muito a vontade. Como os dormitórios estavam lotados, centenas de pessoas dormiram no chão, seja no patio dos prédios, na rua ou nos templos. Alguns dos quartos são cobrados, apesar de preços baixíssimos, mas em geral e tudo na base da doação.


Attari, a fronteira com o Paquistão não fica muito longe dali, e fui dar uma olhada na cerimonia de recolhimento da bandeira no final da tarde. E algo bem turístico, um show montado, mas muito divertido. Na verdade e para turista indiano, que e a maioria esmagadora, não para estrangeiros. Como estamos na Índia, filas e milhares de pessoas se aproximavam das arquibancadas perto da divisa dos países (sim arquibancadas!!!). La inicia uma cerimonia, com gritos, danças, provocações com bandeiras e marchas dos enfeitados soldados. Tudo devidamente ensaiado acontecia da mesma forma do lado do Paquistão. Ironicamente uma grande rivalidade e ameaças de guerras, e transformada num show, rentável para ambos os lados. Sim, rentável financeiramente, pois existem lojas de suvenires onde se pode comprar camisetas, canecas, DVDs, etc. Todos com sorriso na cara, jovens dançando no maior estilo Bollywood no meio da rua. Bizarro!!! Apesar de um pouco longo, foi muito divertido. Triste foi ver aquela que e a unica forma de passar de um pais para o outro ao longo da enorme fronteira, e não ir para la. Eu realmente queria fazer Paquistão e Irã, mas fica para uma próxima vez…

Pequena fila para ver a bandeira ser recolhida

 

Dançando para provocar, boa forma de rivalidade!!


De volta a Amstar, como meu óculos de camelô havia quebrado, e resolvi fazer o teste da honestidade entre os estrangeiros. Deixei ele largado no dormitório enquanto fui ao banheiro. Não demorou 5 minutos para ele desaparecer. Interessante como e possivel viajar pelo mundo, lugares paupérrimos sem ter problemas e ser roubado por um ocidental. Mas que ele deve ter ficado de cara ao ver que correu um risco por um óculos que não vai poder usar, deve…

Povo de Punjab e muito gente boa!!

 

Pessoal se virando para dormir em qualquer canto. Este era o patio interno do dormitório!!

Voltei para Jallander de trem (3 classe para sentir o clima!), e desta vez deu tudo certo com a troca de passagens. Este contra tempo fez com que alem de ter que inverter meu roteiro, o que não tem problema nenhum, eu tivesse que encurtar minha estadia em Amstar, o que doeu, pois adorei o lugar. Peguei um ônibus para Daransala, mas no caminho conheci um estudante, que depois de muita conversa e perceber meu interesse pela cultura e religião deles, me convidou para almoçar na sua casa. Descemos em Hashpuir, pegamos outro ônibus até sua vila. Morava numa casa boa, com um pequeno jardim onde tinham dois búfalos! La chegando me apresentou para o pai e o avo, e se retirou da sala. O pai falava pouco inglês, e o avo bem. A dificuldade e que o avo tinha um problema e sua voz saia pela garganta, o que dificultou um pouco a comunicação…haha Foi proveitoso e divertido, alem de ganhar um delicioso almoço. Consegui diversas informações, e me levaram para conhecer a região rapidamente.

anfitriões

Mas tinha que voltar para estrada, que logo ficou cheia de curvas, ate chegar em Daransala. Já era tarde, e peguei o ultimo ônibus ate Mc Leonganj, um pouco mais para cima da montanha.
Daransala e onde funciona o governo do Tibet no exílio, e também residencia da vossa santidade Dalai Lama. Houvia maravilhas do lugar, que era mais parecido com o Tibet do que o próprio Tibet e blabla bla. Confesso que isto fez com que me decepcionasse um pouco. Nada de cultura tibetana explicita, e sim muito misturada com indiana e principalmente com a ocidental. Parecia que todos os viajantes que estavam na Índia fugiam do calor e estavam ali. Se no sudeste asiático o padrão dos mochileiros era jovem inglês, com cabelos cuidadosamente despenteados, roupas de marcas falsificadas e óculos coloridos, aqui era diferente. Um pouco mais velhos, estilo bixo-grilo ou mamãe quero ser hippie. Muitos dread locks, e muita falsa espiritualidade também. Em vez de bêbados ficavam chapados. Assim como no sudeste asiático, era difícil distinguir um do outro, pois pareciam estar de uniforme. Incrível esta falta de personalidade, necessidade de fazer parte de um grupo. De qualquer forma o lugar e muito bonito, rodeado com montanhas com seus picos nevados, que podiam ser vistos quando não chovia ou estava nublado, o que era comum. Ótimo lugar para caminhadas, um pequeno mas muito bem montado museu sobre o Tibet e invasão chinesa, e templos onde tentam manter e ensinar as tradições tibetanas.

Bandeiras de orações

Um dia me sentei na internet e ao lado estava o casal de russos/americanos que conhecemos em Tirunavamalai, no inicio da viagem pela Índia. Jantamos juntos um dia, e batemos papo tomando um chá em um outro. Encontrei novamente também Andy e Sylvia, o casal alemão que ficou ainda mais próximos da gente. Com eles também sai para jantar, ver filmes sobre o Tibet e conversar bastante. O clima frio diminuiu meu ritmo, e aproveitei para terminar de ler Seeing (Ensaio sobre a Lucidez, pois o Saramago é Português!!), meio que continuação de Ensaio sobre a Cegueira, que virou filme estes tempos atras.

Aqui a bandeira do Tibet e livre, longe da repressão chinesa

Ônibus para Delhi, onde peguei um hotel na área de Pahaganj, o bazar na frente da estacão de Nova Delhi, onde encontraria com a Bibi no dia seguinte. Tava muuuito quente, e com a chegada dela deu só para dar mais uma perambulada, comprar mais umas coisinhas para vender no Brasil e descansar, pois tínhamos que ir para o aeroporto em plena madrugada. Nossa saída foi surreal, com dezenas de vacas dormindo na frente do táxi, em plena capital do pais. Com certeza sentiríamos saudades, mas dois meses e meio haviam se passado, mas tínhamos que partir…

Para pensar:

Nós temos casas maiores mas famílias mais pequenas;
mais confortos, mas menos tempo;
Nós temos mais cursos, mas menos senso;
mais conhecimento, mas menos julgamento;
mais peritos, mas mais problemas;
mais remédios, mas menos saúde;
Nós fizemos o caminho até à lua e de volta,
mas temos problemas em atravessar a rua para conhecer um novo vizinho;
Nós contruimos mais computadores para suportarem mais informação
para produzir mais exemplares que nunca,
mas temos menos comunicação;
Nós tornámo-nos grandes em quantidade,
mas curtos em qualidade.
Estes são tempos de “fast-foods”,
mas de digestão lenta;
Homens altos mas de personalidade “curta”;
Lucros íngremes mas relações superficiais;
É uma época onde se vê muito à janela,
mas nada dentro do quarto.
[The Paradox Of Our Age, by His Holiness the 14th Dalai Lama]