O Feriado Cristão e a Cidade Sagrada Muçulmana

De volta a Addis, ainda tínhamos que fazer algumas coisas, antes de ir para Harar. Visitamos o Museu Nacional e o Museu Etnológico. Deu para aprender m pouco mais sobre as diversas tribos do pais (são 80 línguas e 200 dialetos diferentes), ver varias pinturas ortodoxas com Jesus negro, mas o ponto alto para mim foi a parte dos fosseis dos “Homídeos”. Para quem não sabe, eu quando tinha 6 ou 7 anos não queria ser jogador de futebol nem bombeiro, queria ser paleontólogo, e isto foi muito antes da geração parque dos dinossauros.

Existe uma seção que explica toda a evolução da especie humana, com vários fosseis de nossos ancestrais que foram achados aqui. Lembram da Lucy, nossa tatatatataravo? Ela era etíope. Os fosseis da Etiópia são os mais antigos e em excelente estado de conservação.

Já que estávamos por aqui resolvemos estender um pouco mais para ver a comemoração do Meskel, que e o dia que acharam a Cruz. Se o ano novo foi uma comemoração discreta, esta foi uma grande manifestação popular. Todas as ruas perto do centro estavam bloqueadas, milhares de pessoas caminhavam com seus trajes típicos em direção a Meskel Square, no centro da cidade. Quando chegamos, depois de muita dificuldade para arranjar transporte, as arquibancadas já estavam lotadas. Diversos desfiles de escolas, alegorias celebrando Cruz sagrada e a Etiópia. Discurso do Papa da Igreja Ortodoxa Etíope, devidamente protegido por atiradores de elite em cima dos prédios. População super comportada, sentada e ordeira. Eram milhares e milhares de pessoas, difícil estimar, mas acho que devia ter mais de 100000. Todas elas com velas em punho, numa cena bonita, durante a queima de uma fogueira de palha e de fogos de artificio.

Praca Meskel

Praça Meskel

Comemorando Meskel

Comemorando Meskel

Todo mundo curtindo, com branco e as cores da Etiopia

Todo mundo curtindo, com branco e as cores da Etiópia

O Samuel escolheu para se mudar para outra casa bem neste dia, então depois das celebrações fomos para a casa nova, depois de ter jantado num restaurante tipico de uma das tribos. Cardápio? Ingera (para variar) com carne moída crua picante (novidade!). Muito bom, comi um monte.

Já estávamos prontos para seguir viagem, então bem cedo pegamos um ônibus para Harar. Viagem longa, mas com um asfalto de excelente qualidade. A temperatura ia aumentando a medida que nos aproximávamos de Harar. A paisagem também foi se modificando, o verde foi desaparecendo gradativamente, e a areia aumentando na mesma proporção. Chegamos na cidade e depois de uma longa discussão sobe preço ficamos no primeiro hotel que visitamos. Quarto com duas camas e um colchão no chão.

Harar e a quarta cidade mais sagrada para os muçulmanos, depois de Meca, Medina e Jerusalém. E uma antiga cidade murada, com um quilometro quadrado e praticamente 100 Mesquitas.

Existem 100, aqui estao 2

Existem 100, aqui estão 2

Mesmo sendo final de tarde o calor era insuportável. Ficamos largados num restaurante, e demos uma volta na cidade velha. Nós estávamos na cidade nova, para fora dos muros, e que tem maioria crista. Ao caminhar na cidade murada, dentre tantas mesquitas, no centro da cidade uma Igreja Ortodoxa. Aqui a paz prospera…

Ruas da cidade velha

Ruas da cidade velha

Cores Vivas

Cores Vivas

Indo para a escola

Indo para a escola

A cidade é pequena, e no outro dia andamos pelas centenas de ruelas estreitas, surpreendentemente com portões de casas pintados com cores fortes. Visitamos pequenos museus, conversamos com pessoas, passamos no mercado de carne de camelo, e encontramos um antigo amigo. Sim, no meio da rua encontrei um cara que conversei durante horas na viagem de Nairóbi para Moyale, e que ate ficou no mesmo hotel que a gente. Que coincidência. Muito gente boa, nos levou para a casa dele para apresentar a família. Sua esposa ofereceu a cerimonia do cafe, tostando os grãos e servindo junto com pipoca. Ficamos brincando com a comunicativa filha de 4 anos ate a hora de sairmos. Combinamos de ver alimentarem as hienas mais tarde e fomos tomar um sorvete no final e tarde.

Amigos!!

Amigos!!

Existe uma tradição em Harar em que todo anoitecer alimentam hienas logo na saída de um dos portões da cidade. Dizem que faziam isto em épocas de fartura, para que em épocas de seca as hienas não atacassem os homens e seus rebanhos de cabras e ovelhas. Parece que funcionou, pois hoje as hienas circulam livremente durante a noite sem causar problemas. Hoje este “evento” já se tornou turístico, e pedem uma contribuição para pagar as “pelancas”. De qualquer forma fomos conferir, e os animais são bonzinhos(hehe). Pensar que já morri de medo daquelas hienas circulando pelas nossas barracas na Botsuana, e aqui estava eu dando de comer na boca dos bichinhos. Primeiro com a mão, depois com a boca!! Foi divertido.

Depois de muito tempo de Africa os animais passam a te respeitar...hehe

Depois de muito tempo de Africa os animais passam a te respeitar…hehe

Uma delicia de cidade, onde o tempo não passa. O pessoal leva o Chat a serio aqui e masca durante o dia inteiro. No final da tarde parecem Zumbis, mortos vivos perambulando. Estava enganado quando falei que era que nem Red Bull. Bem, não sei o que aconteceria se alguém tomasse Red Bull por 8 horas seguidas…

Harar

Harar

Portao principal

Portão principal

Tivemos uma grande discussão no hotel, pois estávamos usando outro quarto para tomar banho. Nosso chuveiro não funcionava direito e ninguém deu atenção a nossas reclamações. Resolveram implicar com o preço, pois estávamos pagando a tabela que era para 2 e não para 3. Como tínhamos combinado não cedemos, e ameaçaram tirar o lençol do colchão do chão. Eu que tava dormindo ali e virei um bicho. Briguei, ameacei colocar na internet e blalala e no final das contas deu certo.

Cedo seguimos para jijiga. No ônibus fiquei conversando com um Sr que tinha bastante informações sobre o Brasil, mas queria saber ainda mais. Queria saber minha opinião de como melhorar a Etiópia dentre outras coisas. Sempre encontro pessoas curiosas, mas algumas fazem perguntas difíceis, e o assunto se torna profundo. Muito legal, mas de muita responsabilidade para responder. Fizemos uma rápida conexão para Wajjale. A temperatura aumentava ainda mais, e agora era só deserto mesmo. Passamos por uma área onde estavam tirando minas terrestres ao lado da estrada, fruto de uma guerra já de algum tempo  entre Etiópia e Somália.

Logo nos aproximamos da fonteira da Somália. Pera ai, aqui não e Somália já faz muito tempo…

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Obeliscos, lendas, igrejas de pedra e mais verde

Antes do sol nascer já estávamos chegando no caminhão. Fora o ajudante, tinha outro figura. Reclamamos, pois não era o combinado. Falaram que ia só ate ali na frente, mas acabou indo a viagem toda. Pouco depois de Gonder começou o sobe e desce. Curvas passando por precipícios. Vista impressionante das montanhas. Logo deu para avistar as Simien Montains, longa cadeia de montanhas que se estende por toda esta região. Muitas destas montanhas parecem com dedos apontando para cima.

Precipicio

Precipício

Siemen Mountains

Siemen Mountains

Paramos em algumas vilas para tomar cafe, almoçar. Uma delas, muito pequena, chamava a atenção pela quantidade de mesas de pebolim espalhadas pela rua. Pessoal gente boa, vista maravilhosa, cabine apertada, e viagem longa, pois o caminhão ia muito devagar com tanta curva. Final de tarde chegamos a Shire, e falaram que era o ponto final, que ficariam ali. Peraí, não era o combinado. Já falamos que íamos na delegacia, que queríamos que alguém nos acompanhasse, fizemos pressão. No final das contas pagaram a passagem de uma van que estava saindo para Axum. Bastante correria, mas chegamos em Axum no mesmo dia. No caminho passamos por carcaças de tanques, resultado das guerras que ocorreram por aqui.

Axum foi um dos maiores impérios do mundo. Muito respeitado pelo império romano. Dizem que foi criado pelo Tataraneto do Noe, ou algo assim. A Etiópia tem muitas, mas muitas citações no velho testamento. A Bíblica Rainha Sheba saiu desta região para visitar o Rei Salomão em Jerusalém e voltou gravida. O filho foi chamado de Davi e posteriormente de Menelik, e voltou para Jerusalém para aprender as leis de Moises. Ele teria voltado com a Arca que contem os dez mandamentos.

O império de Axum durou centenas de anos, e deve ter terminado devido a duas razoes. A perda do controle do Mar vermelho para os Árabes e por terem cortados muitas arvores. Parece que não aprendemos, a historia se repete…

Axum, mesmo sendo cristão, ofereceu proteção aos muçulmanos, que estavam sendo perseguidos na época. Muitos se refugiaram nesta região, inclusive uma das esposas de Maomé. Ele inclusive cita Axum como um lugar de paz. Já houveram sangrentos conflitos entre os cristãos ortodoxos e muçulmanos, mas em geral sempre conviveram pacificamente. Ate hoje se dão super bem, e se respeitam bastante, desde que levem a religião a serio, independente de qual seja.

Axum é hoje uma pequena cidade, difícil acreditar que foi um dos maiores impérios do mundo. Conhecemos um americano, Michael, que passou a viajar com a gente. Ele voou para Jerusalém, rodou ate o Egito e voou ate aqui. Tentamos ver o que dava andando, mas algumas coisas tivemos que pegar tuk-tuk. Existem gigantescos obeliscos de pedra, todos tralhados, desenhados. Muito bacana. Junto existe um bom museu, que passa bastante informação da região. Lembram que um dos reis magos era negro? De onde vocês acham que ele era? Sim, Baltasar era o Rei de Axum, e foi visitar Cristo no seu nascimento.

Axum, pequena cidade hoje, grande imperio no passado

Axum, pequena cidade hoje, grande império no passado

Logo na frente dos obeliscos esta a Igreja St Mary Zion. Na verdade tem uma nova construção da igreja e as ruínas da antiga. Tem um local onde juram que está a Arca com os Dez mandamentos. Esta historia é mais difícil de acreditar, mas já houve ate guerra com os judeus por causa desta historia. Se pensarmos que a Igreja Católica afirma que possui tantas relíquias como pedaços da Cruz, o manto que cobriu Jesus apos ter sido retirado da cruz, por que a Igreja Ortodoxa etíope não pode ter a sua?

Obelisco

Obelisco

Igreja St Mary Zion

Igreja St Mary Zion

Mais obeliscos

Mais obeliscos

Seguimos estrada sentido Wukro. Voltou a ter asfalto (entre Gonder e Axum foi estrada de terra), mas muito sobe e desce e curvas, portanto viagem demorada. Ou o pessoal não ta acostumado a viajar, ou o cafe da manha foi reforçado, pois todo mundo passou mal. Foi um tal de vomitar e distribuir sacolas de supermercado. Uma mulher sentou com uma criança do meu lado, e quando percebi que a coisa tava feia dei um pulo e me safei por pouco. Nojento. Nesta região do Tigre, existem mais de 100 igrejas de pedra, mas já descobri faz tempo que não da para ver tudo. Ficam muito longe, e o ideal e ter um transporte particular. Como o Guru e o Michael não tavam nem um pouco dispostos a alugar um carro, visitamos 2 igrejas. Uma bem perto da cidade e outra que foi um empenho.

Igreja de pedra em Wukro

Igreja de pedra em Wukro

Ficamos esperando transporte publico por um tempo e nada. Daí acabou passando uma caminhonete e pegamos carona. Rodamos vários KM ate uma pequena vila onde ficava a outra igreja. Visitamos e tal, mas é para voltar. Nem sinal de transporte ou carros. Ficamos um bom tempo la, ate que apareceu um ônibus empanturrado de gente. Entramos e voltamos para Wukro. No ônibus passaram uma bandeja com Ingera, tipo comunitária, e deu para matar a fome.

Igreja na regiao de Tigre

Igreja na regiao de Tigre

Em Wukro conseguimos pegar transporte ate Mekele, capital da região. La tentamos achar uma forma de ir para  Danakil, região que fica abaixo do nível do mar cheia de vulcões, com lagos de larva permanentes. A temperatura chega a 50 graus. Sabíamos que seria caro, pois preciasa de um carro de apoio para garantir a segurança, mas mão conseguimos pois não é a época. Bem, negocio era ir para Lalibela então.

Bem cedo pegamos um ônibus ate Woldia. Todos falavam que teríamos que dormir la, e ir para Lalibela no dia seguinte, mas conseguimos uma van até Gashema e pegamos carona ate Lalibela. Lalibela fica nas montanhas, uma pequena vila, onde tudo acontece bem devagar. La estão as principais igrejas de pedra. Algumas das igrejas foram totalmente esculpidas, não sobrando rocha, só a construção. E fantástico. Existem 11 principais, separadas em 3 grupos. Algumas delas são interligadas por tuneis, o que da um charme ainda maior.

Igrejas de pedra de Lalibela

Igrejas de pedra de Lalibela

Mais Lalibela

Mais Lalibela

Muita tranquilidade em Lalibela

Muita tranquilidade em Lalibela

Definitivamente Lalibela e a principal atracão da Etiópia. O estado de conservação das igrejas é incrível. A maioria delas foi construída com um só bloco de pedra, sem encaixes.

Igreja de Sao Jorge

Igreja de São Jorge

Outro angulo

Outro angulo

Na nossa estadia pela região reencontramos o Servio e o Polonês rastafaris. Conheci um Brasileiro/Holandês que ta trabalhando na Etiópia. Ha, também conheci um figura que esta viajando a 22 anos, e já visitou 170 países. Depois falam que eu que sou maluco…hhehe

Para voltar para Addis, novamente tivemos que madrugar. Não era nem 4:30h e já estávamos indo para a rodoviária. Chegamos la e tava fechada ainda, mas estavam vendendo as passagens. Compramos, guardei o troco no “money belt” e a passagem no bolso. Ficamos esperando para entrar no portão quando me empurraram. Me empurraram de novo e eu ate peguei a mochila e passei para a frente (to viajando com a mochila pequena, a grande ficou e Addis) pois podiam ta querendo pegar alguma coisa. Quando vi,tinham levado a minha passagem. Estatística, um dia ia acontecer. Pelo menos o cara lembrava de mim e pude viajar. Ele tentou cobrar mais (uma senhora apareceu com minha passagem), mas acabou dando tudo certo. Só a raiva de ter sido roubado. Eles são muito rápidos.

Chegamos em Desie onde também falavam que tínhamos que passar a noite. uma cidade super sem graça, com a avenida principal toda esburacada. Solução? Depois da almoçarmos fomos procurar um caminhão. Não demoramos muito para achar um que já estava saindo.

Veerde!!

Veerde!!

O motorista era super divertido, cantava e dançava enquanto mascava Qat. O ajudante não cabia na cabine, pois agora eramos 3, e foi na caçamba, junto com os sacos de feijão, embaixo da lona. Não demorou muito e o caminhão quebrou. Ficamos um tempo na estrada e depois conseguimos ir ate uma cidade para terminar de arrumar. Demorou mais um bom tempo. Finalmente seguimos estrada. Era para chegarmos as 11 da noite, mas já estávamos madrugada a dentro devido aos contratempos. O motorista passou a falar menos e andar mais devagar. Percebi que ele tava com sono, mesmo depois de mascar tanto Qat. Como tava do lado dele, primeiro puxei papo, depois passei a dar uns ” pedala” e uns “se liga” nele. Falei que se tivesse cansado era para parar. Ele parou diversas vezes para tirar uma soneca. Resultado, chegamos só de manha, e eu não dormi nada para ficar cuidando para o infeliz não dormir. Pelo menos chegamos sãos e salvos em Addis.

Montanhas, Monastérios no lago, Castelos e muito verde

O chamado Circuito Histórico é a principal atracão da Etiópia. Ao contrario da maioria dos países africanos, a natureza e praia aqui ficam em segundo lugar (na verdade eles tem ótimos parques nacionais, montanhas e, tribos).

Já tínhamos ido para o Mercato, bairro muçulmano de onde saiam os ônibus, portanto foi só acordar cedo para pegar o ônibus sentido Dahir Dar, nosso primeiro destino. Agora alem do horário (usam o relógio das 6 as 6, assim como o ki-swahili time) tínhamos que prestar atenção nas datas diferenciadas. Ônibus 03/01/2002 as 11 horas, na verdade é as 5 da manhã em setembro de 2009…

Ônibus simples, com poltronas que não reclinam. Saiu no horário, pois era o primeiro ônibus, e saem quando ficam cheio. Dormi e acordei algumas horas depois, com o ônibus ziguezagueando. Estávamos no topo de um cânion, com uma vista impressionante. O ônibus ia devagar, mesmo a estrada sendo de asfalto de qualidade. Eram muitas curvas para contornar tanta montanha. O interior da Etiópia surpreendeu desde o primeiro dia. Nada lembra aquelas cenas que todos tem na memoria do problema da fome de 84/85. Tirando as regiões de deserto, localizadas no sul e no leste, a Etiópia e verde, muito verde. E também muito montanhosa. Parece que 50% das áreas do continente africano  ficam acima de 2000 m de altitude e, 80% acima de 3000 m estão na Etiópia.

A viagem que ja era longa se prolongou um pouco mais por causa da queda de uma barreira. Sem problemas, saímos do ônibus e ficamos curtindo o visual. Passamos por muitas montanhas, belas paisagens ate chegar em Bahir Dar. Bonita cidade, com uma larga avenida com suas palmeiras, na beira do lago Tana. Não foi muito difícil de achar um bom e barato hotel. Depois correr para um cafe para comer alguma coisa, aproveitando o movimento do final de tarde.

Paisagem

Paisagem

Queda de barreira

Queda de barreira

Bahir Dar

Bahir Dar

Dormimos cedo porque o dia seguinte seria longo. Saímos para pesquisar os preços dos barcos que levam ate os monastérios do lago. Como variavam bastante não fechamos nada, mas pelo menos já tínhamos uma ideia. Pegamos uma van até Tis Abay, onde fica uma cachoeira no chamado Blue Nile. A cachoeira não e muito longe da pequena vila, e e claro que fomos acompanhados por dezenas de crianças que nos cercaram. A cachoeira é bonita, mas muito menor que a que aparece na nota de 1 birr. Isto acontece porque criaram uma barragem, e as quedas foram desviadas. Hoje só 20% das quedas ainda existem.

No caminho da cachoeira

No caminho da cachoeira

Blue Nile falls

Blue Nile falls

No retorno tivemos que esperar um bom tempo até aparecer um ônibus. Um cara ofereceu ajuda, falou que trabalhava para o ônibus. Quando abriu a porta, a fila desapareceu, e todos se empurravam para entrar no ônibus. Não tive outra opção a não ser entrar na briga. Depois de muito empurra empurra consegui entrar. Quando vi, lá estava o cara sentado, guardando lugar para gente. Como nada é de graça queria vender o lugar. Falamos que iriamos de pé, ele não gostou muito, mas acabou que não tivemos que pagar.

De volta a Bahir Dar acertamos o barco com uma das pessoas que pegamos o telefone. Conseguimos um bom preço, depois de muita pechincha. Insistiram que pagássemos antecipado. Não gostamos muito da historia, mas acabamos pagando metade. Dia seguinte esta pessoa que acertamos tudo liga dizendo que não vai poder nos buscar no hotel, mas para irmos ate o Ghion Hotel. Falou que era para pagarmos a diferença la, o quanto eles pedissem. Não estava cheirando bem. Insistimos para que alguém fosse nos buscar, mas como demoraram acabamos indo no hotel. Falaram que não conheciam o cara que vendeu o passeio, que deveríamos chamar a policia e tal. Parecia meio armação. Chamamos a policia, fomos dar queixa e tudo parecia ainda mais estranho. Quando falamos que queríamos dar uma queixa oficial, só nos passaram um sulfite em branco. Logo depois o Hotel nos ofereceu o passeio de graça. Acho que não imaginavam que iriamos levar o caso adiante.

Junto foi um espanhol, alem de um Servio e um polonês Rastafaris. Visitamos algumas pequenas ilhas, onde estão os monastérios da igreja ortodoxa etíope. Existem dezenas deles, mas já faz tempo que aprendi que não da para ver tudo. Em cada ilha o monge nos recepcionava e nos mostrava as gravuras, cruzes e contava a historia do lugar. São relativamente simples, mas de uma grande riqueza cultural. Pinturas mostravam um Jesus negro, bem mais realistas, pela região onde ele nasceu. Lugar de muita paz, e excelente para reflexão.

Dentro do monasterio

Dentro do monastério

Detalhes

Detalhes

pinturas

pinturas

O Sérvio que estava com a gente é musico e tocou algumas musicas com o Soufly (Max ExSepultura), e como é rasta perguntei se conhecia alguma banda de Reggae do Brasil. Ele rapidamente respondeu, conheci o pessoal do Djambi num festival na Servia. Porra, Djambi, de Curitiba, que tantas vezes escutei na ilha do mel. Caí na risada. O mundo é pequeno mesmo.

Esta região onde viviam os Judeus etíopes. Algumas famílias ainda permanecem. Israel “resgatou” milhares de pessoas em duas gigantescas operações. A primeira foi em 1984, e foi chamada Operação Moises. O governo comunista não autorizou a saída dos judeus etíopes (chamados de Falashas) do pais, e Israel fez um plano de fuga onde milhares de pessoas foram caminhando ate o Sudão, e de la levadas para Israel. Em 1991 teve a operação Salomão. Desta vez o governo queria que Israel pagasse pelos Falashas. Mais milhares de pessoas foram levadas para Israel numa operação noturna, desta vez utilizando aviões, saindo da Etiópia. Parentes do meu anfitrião de Addis saíram da Etiópia desta forma.

Voltando resolvemos levar o caso do dinheiro adiante. Tínhamos pagado muito menos que todo mundo, mas para complicar a vida do “fugitivo” falamos que tínhamos pagado tudo (que era menos que muitas pessoas pagaram). Soubemos pelo espanhol que ele comprara da mesma pessoa, que deu confusão também, e que encontrou este cara no Ghion hotel. Era tudo armação. Fomos na policia do turista e demos uma queixa, desta forma foi possível pegar uma van para Gonder tranquilamente, sem que alguém questionasse que não pagamos.

A viagem ate Gonder foi rápida, poucas horas. Lá tivemos mais dificuldade de achar um hotel bom e barato. Optamos pelo barato. Também não foi fácil de escolher entre um dos excelentes Cafés. As ruas estava cheias, alias os etíopes adoram sair. Não nos prorrogamos muito pois o próximo dia seria longo.

Gonder já foi a capital da Etiópia. Seus castelos, devidamente murados eram o centro politico do país no seculo 17. O principal castelo fica bem no meio da cidade. Muito bonito e imponente. Está clara a influencia que a Etiópia recebia de outros continentes, este tipo de construção era muito avançada para a época. Um pouco mais afastada fica uma “piscina” gigantesca onde milhares de pessoas eram batizadas ao mesmo tempo. Visitamos também uma igreja Ortodoxa que fica no topo de uma montanha. Estava tento missa então não pudemos entrar, mas foi legal ver a movimentação do lugar. A Igreja Ortodoxa transmite suas missas com um auto-falante, assim como as mesquitas costumam fazer. Caminhando pelos castelos ao lado da igreja, passei por um enxame de abelhas e uma me picou. Me estapeava para tirar as outras que ficaram presas na minha camiseta quando um senhor se aproximou, ele falou para eu esfregar a picada, colocar o dedo no nariz e passar na picada novamente. E a simpatia deles. Não sei se funciona, pois inchou, mas vai que seria pior se eu não tivesse feito…haha

Castelo de Gonder

Castelo de Gonder

Mais castelos

Mais castelos

Ruinas proximas da igreja

Ruínas próximas da igreja

Igreja Ortodoxa

Igreja Ortodoxa

Final de tarde tinha lugar marcado. Café de um hotel no topo da montanha mais alta, com vista para os castelos.

Vista panoramica de Gonder

Vista panorâmica de Gonder

Diziam que demora 2 dias de Gonder até Axum de ônibus. Em vez de irmos para a rodoviária fomos para o estacionamento de caminhões. Tivemos que arranjar um interprete, pois todos os motoristas só falavam Amarico. Combinamos de sair cedo, só nos dois e o motorista na cabine. O ajudante iria na cama atras da cabine. Tudo certo para a viagem direta até Axum.

Feliz 2002!!!

Em 2002 eu trabalhava numa cidade no interior do Parana (15.000 habitantes, contando a região rural). Até eu assumir a gerência, trabalhava em turnos. Lembro que no ano novo iniciaria a trabalhar as 6 da manha, portanto tinha que acordar 5 e pouco. Foi um ano novo muito sem graça. Por sorte meu amigo Nilceu passou la e me levou ate o calcadão, onde olhei meia duzia de fogos e fui dormir. Como fui um bom menino, Deus resolveu me dar outra chance. Cheguei em Addis Ababa no dia 10 de Setembro, um dia antes do ano novo Etíope. A Etiópia segue o calendário da Igreja Ortodoxa, portanto entraríamos no ano 2002!!!

No dia seguinte as criancas continuavam cantando nas ruas

No dia seguinte as criancas continuavam cantando nas ruas

O Guru trabalhou com uma Etíope na Califórnia, que indicou um amigo para nos hospedar. O nome dele é Samuel. Ele morou 12 anos nos EUA, onde fez faculdade e 3 mestrados em faculdades de ponta. Voltou recentemente para a Etiópia para iniciar negócios e expandir para outros países africanos. Nos recebeu super bem, e logo nos sentimos em casa. Fomos conhecer seu escritório, ja emendamos com happy hour, ate a comemoração do ano novo em um Hotel. Tive contato com muitos Etíopes que moraram nos EUA e retornaram depois de terem se formado em grandes universidades americanas. Economistas, Cientistas Políticos, pessoas ligadas a computação… Muitos filhos de ex ministros, prefeitos, mas outros que cresceram na vida quando tiveram oportunidade de crescer. Foram longas conversas, que se estenderam pelos próximos dias que ficamos em Addis.

Samuel e Mimi

Samuel e Mimi

O ano novo daqui não é nada parecido com o de Copacabana. E bem simples, com algumas fogueiras de palha, musica e muita alegria. Tinham algumas pessoas nas ruas, andando para cima e para baixo, mas as comemorações são mais em lugares fechados. Espalham um capim pelo chão, alem de uma decoração simples. Não conseguimos estender muito noite a dentro, coisa comum, pois estávamos quebrados da longa viagem ate aqui. Não teve problema, pois a vida social continuou por mais alguns dias, eles inclusive não deixavam a gente sair de Addis rumo ao norte, pois sempre falavam que tinha uma atividade que tínhamos que participar.  Foram muitos jantares, almoços, encontros em lugares bacanas, como o bar do Sheraton. Tive que emprestar roupa, pois não viajo com “roupas bonitas” hehe.

Em uma das conversas surgiu ate uma oportunidade para eu trabalhar por aqui, mas acho que esta cedo para eu retornar da minha aposentadoria…hehe

Durante o dia, entre os encontros sociais, deu para rodar um pouco pela cidade, que é um canteiro de obras. Construções por todos os lados. Algumas regiões com avenidas largas, estruturadas mostram um lado desenvolvido, outras regiões mais sujas, com seus taxis “Lada” mostram o lado B. O que chamou atenção é a quantidade de Cafés que existem na cidade. Cada quadra tem diversos, e a população local frequenta sempre. Acho que é a cidade do mundo com maior concentração de cafés. Alias, o cafe etíope é de excelente qualidade. Com tantas opções, passamos algumas horas nestas cafeterias, que sempre servem boa comida também.

Experiencia muito rica, não por estar com a elite de um país, mas pelo que eles pensam, pela vontade de construir, de mudar, de transformar. Foi praticamente um seminário, onde cada roda tinha um tópico diferente.

O longo caminho de Nairobi para Addis Ababa

Tudo já estava agilizado então saímos só 3 horas antes do horário marcado com o motorista do caminhão. O Matatu demorou bastante, ate mandamos mensagem para o motorista para garantir. Acabamos chegando quinze para as quatro da tarde, pouco antes do combinado. O bairro em questão é Isili, bairro Somali de Nairóbi. Chegando lá nos avisaram que teríamos que esperar. Depois de um tempo nos falaram que não teria mais caminhão, mas teria ônibus. O caminhão iria muito mais rápido que o ônibus, portanto insistimos sem sucesso. Nos colocaram numa sala, e falaram para esperarmos la. Estranhamos e depois de um tempo saímos para dar uma olhada. Descobrimos que tinha sim um caminhão indo ate Moyale (fronteira).  Falamos que só iriamos com o caminhão. Nos mudamos para a frente de um bar e ficamos esperando mais um bom tempo. Depois vieram nos falar que era impossível irmos de caminhão, que eles tinham decidido que iriamos de ônibus. Nem adiantou o motorista do caminhão tentar nos ajudar, pois ELES tinham decidido, parecia piada. Pior que o Guru ja tinha pago tudo para garantir o lugar.

Pra piorar era Ramadam, e ninguém vendia comida. Como aqui praticamente so tem Somalis, levam muito a serio. Pra resumir realmente tinha um ônibus, e que surpreendentemente não ia até Isalo, e sim ate Moyale, na fronteira. Estes ônibus são raros, e normalmente tem que se fazer a viagem em etapas.

Depois de comermos, seguimos ate o ônibus que era praticamente um ônibus de linha e não de longa distancia. Milhares de malas, sacolas, caixas no topo, mas levei minha mochila comigo. As 21 hs estávamos saindo, e fui deitado pois sobrara espaço. A alegria não durou muito. Chegando em Isalo, no inicio da madrugada, o ônibus ficou super lotado, inclusive com caixas e bugigangas no corredor. Se olharem no mapa, Isalo não é longe de Nairóbi, tem muito Quênia pela frente, mas é a ultima cidade “estruturada” (na verdade só tem o básico do básico). Dois seguranças devidamente armados subiram no ônibus e passaram a  nos acompanhar ate a fronteira. Ja faz tempo que não existem problemas nesta região, mas as empresas de ônibus parecem se precaver.

Viajamos por horas e horas no meio do nada. O único animal comum aqui e o dik-dik, o menor antílope do mundo, do tamanho de um pequeno cachorro. Paramos poucas vezes, e os locais eram aglomerados de casas, mal da para chamar de vila. Numa das paradas um senhor de idade bastante avançada se aproximou de mim. Era o homem santo da região. Pegou na minha mão, cuspiu levemente e esfregou. Depois passou a mão no meu braco e rosto e me abençoou. Um Queniano traduzia o que ele falava. Falou que homem branco tinha que ser abençoado para passar por aquelas terras, e que eu era uma pessoa do bem. Ele disse que nunca se enganara, e que eu deveria levar a paz comigo… Muito bacana!

A Paisagem já estava bastante desértica ate chegarmos em Marsabit. Pequena região onde existe um parque nacional. Na bera da estrada pudemos ver alguns animais, dentre eles uma manada de elefantes. A paisagem continuou desertica depois deste “oasis” que é Marsabit. Pudemos ver varias crateras de vulcões, que estão espalhadas por esta região. Os Dik-dik foram ficando mais raros, e depois de um tempo só dava para ver alguns camelos, criados por algumas tribos que moram na região. Incrível que por mais inóspita que seja a região, sempre tem alguém se adaptando e sobrevivendo.

Horas e horas de Dida Galgalu, o deserto  de pedra, exatamente 26 hs depois de sairmos de Nairóbi, nos chegamos a Moyale, na fronteira. Procurar um hotel não foi difícil, pq só existem 3 opções. Nem percebi que o banho era frio e de balde, de tanto que estava precisando. Cheguei ate a levar baldes extras para aproveitar bem.

Deserto Dida Galgalu

Deserto Dida Galgalu

Dia seguinte cedo trocamos o restante do dinheiro e atravessamos a fronteira. Do lado da Etiópia o oficial resmungou que eu tinha um carimbo em cima do visto (na verdade não cobria nada). Falou que eu não podia entrar, que teria que voltar e tal. Sabia que ele não podia estar falando serio, mas fiquei preocupado se ele queria uma grana para me liberar. Final das contas só na conversa ele acabou me liberando.  O segundo problema que enfrentamos é que a imigração só abre as 8 hs, e o ônibus sai as 6. Não poderíamos ficar um dia inteiro de bobeira la, então fomos logo descobrindo onde era a parada dos caminhões para arranjar uma carona. Não demorou muito e descobrimos um que estava indo direto ate Addis Ababa. Melhor que o ônibus, que pararia na metade do caminho. Apos negociarmos tivemos que aguardar carregarem o caminha e partimos. Ao contrario do lado do Quênia, onde as estradas são de terra, no lado da Etiópia são todas asfaltadas. Aquelas retas intermináveis, inicialmente toda plana, mas depois começou a surgir um relevo. Paramos umas 2 vezes para carregar carvão de umas comunidades que vivem próximas da estrada, e depois foi meio direto. Na cabine estava eu, Guru, Motorista e um auxiliar. Meio apertado, mas dava para cochilar e eles eram gente boa. Foram mascando Qat do inicio ao final da viagem (igual ao Mira que comentamos em Lamu). Ate experimentei, por uns 5 min, mas é muito ruim. Para fazer efeito tem que mascar por horas. Com certeza vale mais a pena tomar um cafezao ou um Red Bull!! De qualquer forma era bom, pois o motorista ia dirigir a noite toda.

Carona na Etiopia

Carona na Etiópia

Jantamos uma gostosa macarronada, herança dos italianos que ocuparam a Etiópia no período da Segunda Guerra, mas logo continuamos. Já de noite vimos uma pessoa andando no acostamento, de repente ela sumiu. Era um bêbado, que caiu numa valeta. Na mesma vila vimos outro cara dormindo no meio da estrada. Pelo jeito o pessoal gosta de um “gole” aqui…

Na Boleia

Na Boleia

Dormimos pouco, pois preferimos fazer companhia para o motorista, para que ele não dormisse. Passamo por Shashemene, região dos Rastafaris. Alias, a religião Rastafari iniciou na Jamaica, mas adorando um Rei Etíope. Ras= Rei Ta Faris (vejam a musica get up stand up, do Bob Marley). Foram muito influenciados pelo fato da Etiópia ter sempre sido uma nação independente, nunca foi colonizada (existem outras crenças, que o rei fez chover, mas ele não gostou muito da historia). Ela foi ocupada pelos Italianos na guerra, mas a Franca também foi ocupada pelos alemães, não foi?! No final do seculo 19 a Itália também tentou ocupar a Etiópia, mas perdeu a guerra. A Etiópia sempre foi uma nação com grande potencial, altas taxas de crescimento ate os anos 70, quando iniciou um regime comunista que acabou com o pais.

No outro dia pela manha chegamos em Addis Ababa, capital da Etiópia. Uma grande metrópole, uma das maiores da África. As placas em Amarico, língua que falam aqui (escrevem diferente também) dão um charme para o local. Pastores levavam suas ovelhas no meio das ruas. Logo vimos que a Etiópia tinha um estilo próprio, diferente de tudo que vimos na África.