A Índia não pode ser vista como um único pais, mas como vários países juntos. Cada estado e infinitamente diferente do outro. Nesta viagem mais do que nunca pudemos observar isto.
Era a terceira vez que viajava pela Índia, já tinha passado alguns meses no país, mas ao chegar na parte velha de Amritsar, me perguntei: Porque mesmo que eu gostava da Índia? E isto que o estado de Punjab era um dos que eu mais gostava, devido a deliciosa comida e hospitalidade do povo. Mas no primeiro momento o que sobressaia era um barulho ensurdecedor de buzinas, lugar cheio de gente e imundo. Não parecia ser a mesma Amristar que eu estive no ano passado. E não era, pois da outra vez, fiquei todo o tempo dentro do templo, inclusive hospedagem e refeiçoes Passamos uma noite infernal com muito barulho, e no dia seguinte nos mudamos para um outro lugar mais calmo. Paz mesmo só conseguimos no Golden Temple. O Jony e Marco adoraram, foi um bom lugar para fechar a viagem deles. Era a primeira vez da Bibi ali também e fomos todos comer no movimentado refeitório do templo. Bandeijão de qualidade, só o Jony que não encarou pois estava meio mal do estomago.
O Golden Temple e fantástico não e um lugar para ser visitado, é para ser vivido. Sentar na beira da “piscina”, ver o entardecer e aprender mais sobre a cultura local com uma das pessoas que vai acabar parando para bater papo com você.

Nos despedimos dos “Idis”, que pegaram um trem para Agra, onde visitariam o Taj Mahal e voltariam para Delhi, para o voo de volta ao Brasil. No nosso dia de folga fomos tentar conhecer uma região da “Índia rica”, mas a rua tão falada, apesar de lojas internacionais, era imunda e cheia de vacas. Pelo menos a Bibi pode ir num bom salão.
Desde que saímos para viajar, alem da família (que veio), muitos amigos falavam que iriam nos visitar. Muitos gostariam, outros falavam por falar. Mas a Jami, grande amiga nossa, não se importou com uma recém transferência pela empresa para São Paulo, mudança de apartamento, e mesmo assim veio nos encontrar.
Ela nunca tinha feito uma viagem do nosso estilo, muito menos para algum lugar parecido com a Índia (se é que existe). Fizemos questão de busca-la de autorickshaw e foi muito legal ver a cara dela pelo caminho ate a cidade. Desde o inicio ela já quis conhecer as comidinhas, andar pelas ruas secundarias, e tive certeza que seria uma ótima companhia de viagem. Se emocionou no Golden Temple, fez amigos, foi com a Bibi na cerimonia da fronteira (desculpem mas eu sou Jula, Jula Pakistan!haha).
Qualquer viagem pela Índia não esta completa sem uma experiencia com os trens. Pegamos um trem para Jamu, capital de verão do estado Jamu & Caxemira. E chamada de cidade dos templos. Se em Amritsar a religião predominante era dos Sikhs, em Jamu é o Hinduísmo Na frente dos templos tinham grandes barricadas, com arame farpado e exercito. O clima não era muito amistoso, e recalculando os dias que a Jami ficaria na Índia, decidimos não ficar muito tempo ali. Uma forte tempestade a noite, queda de energia, e trovoes que acordaram a Bibi, achando que eram bombas haha. Demos umas voltas, comemos num gostoso restaurante, e estávamos preparados para encarar a estrada até Srinagar.
Estrada longa, cheia de curvas e temperatura caindo com o passar do tempo e com a subida. Muitos Gujards no caminho, povo pastor nômade, que ocupava parte da estrada com suas criações.
Depois de muitas horas de viagem, entramos num túnel estreito, escuro, com 2,5 km de comprimento. Logo na saída do túnel uma placa: “Bem vindos a Caxemira, o paraíso na terra.” Ao fundo uma vista para o magnifico vale, com arvores, plantações flores e rios. Espetacular!
Passamos por pequenas vilas, e já observamos mulheres com véu cobrindo o rosto. Agora estávamos em região muçulmana.
Chegando em Srinagar, nosso plano era de ficar num hotel uma noite, para no outro dia bem cedo ir procurar e comparar os barcos-casas do lago Dal. Acontece que os caxemirianos são ótimos negociantes (para o lado deles) e acabamos cedendo de ir conhecer um barco-casa oferecido, e nos demos super bem!
Os barcos de luxo ficam bem perto da avenida, tem bastante barulho, alem de insistentes vendedores passando de shikara (canoa local) oferecendo coisas. O nosso era meio decadente, mas bem acolhedor. Ficamos mais afastados, num lugar tranquilo, para dentro do lago, cercado de flores de lótus.
Ao contrario dos barcos de Aleppey, que navegavam todo o tempo, os de Srinagar ficam ancorados. Para se conhecer o lago e todo o “waterworld” só de shikara. Pensamos em fazer um passeio curto, no máximo de duas horas, mas foi tao legal que nos empolgamos, e ficamos umas cinco horas explorando os canais, passando por mercados flutuantes, as vilas sobre palafitas com o dia a dia sobre as canoas. Um passeio fantástico, belíssimo !! Existem shikaras simples, mas muitas delas são todas preparadas para passeio, com almofadas e encostos. Tem uma infinidade de shikaras por todo o lado e quase dois mil barcos-casa. A região já foi muito turística mais devido ha algumas guerras e frequentes conflitos, as pessoas passaram a ter medo de viajar por lá. Este ano teve um boom de turismo, dos próprios indianos, e saiu reportagem ate no NY Times (clique aqui).

flores de lotus

Shikara




Barco casa


equipe!
A Caxemira é mais uma daquelas questões polemicas. Na divisão do subcontinente indiano, os ingleses previam só dois países um hindu (Índia), outro muçulmano (Paquistão). Nisto Punjab (Sikh) ficou chupando dedo, e Caxemira também A Caxemira era de maioria muçulmana mas tinha um Marajá hindu, colocado pelos ingleses. Na época da divisão ele ia optar pela Índia (talvez até tentaria uma impossível independência), e por isto foi invadido pelo Paquistão No final da historia ficou 1/3 com o Paquistão e 2/3 com a Índia. No tratado de paz da ONU, teoricamente a população que deveria ser ouvida para definir quem teria direito sobre a Caxemira. Claro que a Índia nunca aceitou esta decisão.
Isto não quer dizer que todo mundo gostaria de ficar com o Paquistão, muito pelo contrario. Conversando com um estudante universitário que participa de protestos pacíficos ele me disse que 70% dos caxemiris querem ser um país independente ( e acreditam que um dia vão conseguir), 25% querem ficar com o Paquistão (a maioria destes são de pequenas vilas) e apenas 5% querem ficar com a Índia (ricos comerciantes de olho na economia indiana).
A Índia está apostando muito na ocupação da Caxemira, e é fácil de ver. Na estrada até lá é muito comum se ver comboios de caminhões com milhares de soldados. Muitos postos de controle e soldados por toda a cidade. Isto quebra um pouco o charme do lugar, mas existem algumas “ilhas” de tranquilidade.
A cidade velha de Srinagar é uma delas. Tranquilidade por causa da ausência do exercito, não pela falta de bagunça O exercito não vai muito lá, pois os locais se reúnem e jogam pedras neles, e sempre da confusão muitas vezes tomando grandes dimensões As ruas são muito estreitas, e as casas possuem uma arquitetura única. Muitas delas com sacadas em madeira toda trabalhada. As mesquitas também tem um estilo próprio sem minaretes, e com o telhado lembrando estupas budistas. Fomos diversos dias nos perder pelas ruas. As grandes atracões não tem endereço certo, elas são as cenas do cotidiano. Lojas de especiarias, carneiros sendo pendurados e carneados no meio da rua e por ai vai. Em volta da mesquita principal aquela sensação de que o tempo parou. Diversas pontes cortam a cidade e dão uma vista fantástica para as construções.





Notamos um templo hindu todo cercado por arames, e ao olharmos curiosos por algum tempo, soldados nos convidaram para entrar. Fizeram uma base militar ali. Estrategicamente protegiam o antigo templo, e controlavam uma ponte bem em frente, que dava acesso para o miolo da cidade velha.
Outro grande refugio são os jardins Munghals. Uma dinastia descendente dos mongóis persas, que dominou boa parte do sul da Asia. Existem diversos jardins, todos floridos, muitos deles com vista para as montanhas ou para o lago Dal.

Jardins
Na noite anterior a nossa partida, mudamos os planos. Fomos convidados para um casamento e não poderíamos perder esta oportunidade. Na verdade tiveram três casamentos bem perto da nossa casa- barco. Os casamentos demoram dias, e fomos acompanhando os barcos chegando com as decorações os mais de 30 carneiros mortos, e todos os vizinhos passando horas preparando a comida. Musica ja de dia, a noiva tendo sua mão pintada com henna, muita comida e festa ate de manha! Bem de madrugada distribuíram cobertores e todos ficaram largados no chão enquanto um homem vestido de mulher fazia um show de musica e dança brincando e provocando os convidados estilo Nei Matogrosso. Nos divertimos muito quando ele tirou a Jami e a Bibi para dançar!!! Demais! Um grupo de músicos tocou a noite inteira e tinham narguilés por todos os cantos.

os preparativos

A noiva

A festa
Quando madrugamos para pegar transporte a musica ainda estava rolando, e ainda teria mais um dia de festa ate o noivo chegar para buscar a noiva. As festas são separadas.
Sabíamos que a viagem seria longa, mas foi ainda mais demorada que o esperado. No total acho que passou de 17 horas viajando pelos Himalaias, passando pelas milhares de curvas, no topo de altíssimos passes com vistas espetaculares. Paramos em Kargil, cidade bem próxima a linha de controle, onde os paquistaneses invadiram a pouco tempo, mostrando que os milhares e milhares de soldados indianos talvez não estejam tao preparados quanto pensam. Na estrada vários acampamentos do exercito, muitos deles fazendo treinamentos de escalada nas montanhas. Saindo da região da caxemira entramos em Ladak. A paisagem ia ficando mais desértica pois estávamos cada vez mais altos. As bandeirinhas de orações budistas passaram a aparecer por tudo que ‘e lado, e as vilas estavam cheias de estupas e monges. Paramos em algumas delas, e gostaríamos de ter podido ficar mais tempo por ali. Chegamos já bem tarde em Leh, e por acaso acaso acabamos ficando numa pousada super bacana. Tinha um jardim todo florido com vista para as montanhas de um lado, e para monastérios e fortes do outro.


A caminho de Leh
Leh fica a mais de 3500 metros de altitude. Confesso que devido a dificuldade para chegar, esperava um lugar mais intocado. Sabia da fama do lugar entre os viajantes, mas não esperava tantas lojas uma perto da outra e restaurantes vendendo pizza e comida ocidental. No meio de tudo isto muitas internet cafés. Por outro lado, a energia elétrica faltou com muita frequência mostrando que ainda existe um certo isolamento.
Chegamos para o ultimo dia do festival de Ladakh, onde teria musica, dança alem das apresentações com mascaras. A partida de polo tinha sido ha dois dias, e perdemos novamente. O final do festival, mostra o termino da temporada. A partir de agora, pode nevar nos passes mais altos. Os viajantes overland saem as pressas sentido Manali (22 horas de estrada terrível , e era para Leh estar tranquila. Mesmo assim acho que vimos mais turistas do que monges.
Na cidade tem um bonito palácio real, um forte com uma super vista para o vale, alem de uma cidade velha e diversos monastérios mas o mais interessante mesmo esta nos seus arredores.




Partimos para as montanhas, caminhando entre vales e bonitas formações rochosas, atravessando rios ate a vila de Rumbak. Uma vila de não mais que 12 casas e um monastério Muitas plantações yaques, e um grande espirito comunitário Região muito bonita, um vale realmente especial. Passamos a noite numa das casas, fomos super bem recebidos. Aproveitamos um monte o lugar, mas na hora de seguir viagem fui voto vencido. Seriam mais 8 horas de caminhada, desta vez passando a 5 mil metros de caminhada. Acabamos voltando pelo mesmo caminho, e encontramos um casal de espanhóis viajando com seu filho de 3 anos. Iam fazer um treking de 25 dias!! Já era o oitavo pais que o moleque conhecia, e sempre ia caminhando, com seu óculos espelhado e todo animado. Pra quem acha que não da para viajar com criança ta ai:

Quem disse que não da para viajar com
criança








A tal da Delhi-belly acabou atrapalhando nossos planos. Não conseguimos explorar tanto a região como gostaríamos mas fizemos o que pudemos. Se tínhamos chegado um dia depois da partida do nosso amigo Koich, por outro lado acabamos encontrando novamente os franceses la do Paquistão.
Depois de tantos meses viajando pela rota da seda (que também passava por aqui), pegamos o primeiro avião Daria para seguir por terra, mas isto mostrava que o tempo estava acabando, e nossa viagem também No pequeno aeroporto parecia uma operação de guerra, com centenas de soldados, burocracia e segurança. O voo foi rápido, com uma super vista de montanhas pela janela.

Em Delhi decidimos não ficar no Pahaganj, barulhento “ camelódromo” onde fiquei nas outras viagens. Ficamos no Manju ka tilla, bairro tibetano, um pouco mais afastado mas bem mais calmo.
Como era a primeira vez da Jami em Delhi, fomos em diversos lugares, muitos deles que eu só tinha ido na minha primeira viagem a Índia em 2005. Foi muito legal, ate porque hoje sou uma pessoa diferente, e vejo os mesmos lugares de forma diferente. Sem contar que e muito legal a cara de alguém que esta andando de rickshaw pela primeira vez pelas ruas de Old Delhi. Comemos no indicado restaurante Karim, fomos ver filme em hindi e não demorou ate nos despedirmos da Jami. Ela foi uma super companheira de viagem, pegou bem o espirito da coisa.

old Delhi
Já estava chegando nossa hora também mas depois de tanto viajar, acho que merecíamos umas ferias da viagem, um pouco de “ descanso”. Se a rota da seda tinha chegado ao fim, tínhamos que pensar em alguma outra coisa…
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