A cidade imperial e o campo da morte

Fazia tempo que eu ensaiava uma viagem para a Cracóvia. Em 2004 eu troquei o leste europeu por uma viagem ao sudeste asiático. Em 2012, depois do casamento da minha irmã na Inglaterra, queria ir para Ucrânia e Polônia, mas no mesmo período aconteceria a Eurocopa nestes países, então optei por um voo barato para o Marrocos e Saara Ocidental.

Finalmente pude conhecer esta incrível cidade, capital imperial da Polônia no passado, patrimônio da Unesco. Cidade invadida pelos Mongóis (Sim o maior império do mundo chegou até a Europa), Nazistas e Soviéticos. Felizmente não foi destruída na segunda guerra e continua muito bem preservada.

Torre do palácio real

Torre do Castelo de Wawel

Igreja

Igreja de Santa Maria, com suas torres diferentes

Cidade universitária, cheia de jovens

Cidade universitária, cheia de jovens

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Catedral

Catedral

Colorida

Colorida

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Sukiennice, na praça central em Stare Miaste (Cidade Velha)

Comida de rua na Rynek Glowny, uma das maiores praças medievais do mundo - Coração da cidade velha

Comida de rua na Rynek Glowny, uma das maiores praças medievais do mundo – Coração da cidade velha

Torre do relogio

Torre do relógio

Ao sul do castelo, fica o Kazimierz antigo bairro judeu, onde ainda existem algumas Sinagogas dentre outros prédios históricos. Lugar mais calmo, com menos turistas, onde vale a pena dar uma caminhada com calma. Milhares de judeus saíram daqui para o campo de extermínio de Auschwitz. Novamente é bom lembrar o  porquê do leste europeu ter uma população tão grande de judeus. Simplesmente porque foram expulsos de diversos reinos da Europa Oriental! Se hoje o anti semitismo não é tão grande na Europa Ocidental, a xenofobia só vem aumentando. Fácil de se observar isto nas ultimas eleições do parlamento Europeu, onde a extrema direita só vem ganhando espaço.

Hitler disse “Quem fala hoje do extermínio dos Armênios?”. E os erros vão se repetindo ao longo da história. Já visitei diversos locais de guerra,  campos de extermínio, de ataques de armas químicas, como em Halabja no Curdistão iraquiano, locais do genocídio em Ruanda e até mesmo o campo de concentração de Dachau, próximo a Munique-Alemanha. Também já estive em memoriais do Holocausto. O que mais me assusta é a forma sistemática e planejada que tudo aconteceu na segunda guerra.

A morte de negros, homossexuais e Ciganos  não é tão lembrada como deveria, mas também fazia parte do plano de extermínio dos nazistas. Os ciganos continuam sofrendo preconceito e sendo colocados a margem da sociedade europeia até hoje.

Fomos visitar o campo de Auschwitz-Birkenau em Oswiecim, onde aconteceram alguns dos maiores massacres da segunda guerra. Para a Bibi, a visita tinha um significado especial, pois foi onde o Victor Frankl, objeto de estudo dela, comprovou sua teoria de “Busca de sentido”. Aquele clima pesado, onde não entendo pessoas ficarem posando para foto, mas cada um com suas manias. Achei que a longa visita guiada traria informações novas, mas neste sentido não foi tão interessante. Pelo menos para mim, vale mais a reflexão em si.

O trabalho

“O trabalho liberta”

Auchewitz

Auschwitz

 

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Pela (ex)Iugoslavia.

Lá na Bósnia! Quem já não usou esta expressão para se referir a algo que esta muito longe? Virou referencia para a faculdade que era longe, o trabalho ou o lugar que alguém morava. A gíria surgiu nos anos 90, quando teve a guerra na região.  Não tínhamos muita informação (ou não buscávamos , eram questões complicadas que poucos tentavam esclarecer ou entender. Pareciam ser coisas terríveis,  genocídio, campo de concentração (a poucos anos do seculo 21!), mas tudo parecia estar muito distante, lá na Bósnia…

Mapa da Ex-Iugoslavia

De Kotor fomos acompanhando a magnifica bahia e algum tempo depois estávamos na imigração.  O oficial da Bósnia-Herzegovina recolheu passaportes de todos e ao olhar o meu me pediu o visto. Eu falei que não precisava, e ele mandou eu o acompanhar. Já devia ser mais de meia noite, e só me faltava dar algum problema. Ele foi ate uma salinha, e me mandou esperar do lado de fora. Depois de um tempo voltou e me mandou para o ônibus.  Os passaportes foram distribuídos novamente quando chamaram o “brasila” para ajudar a identificar os dados no meu passaporte. Ufa, deu tudo certo!

Muitas curvas e dava para ver um pouco de mato no meio da escuridão da estrada. Tinham bancos sobrando e deu para se esticar para dormir. Chegamos quase de manha na rodoviária  que e longe do centro de Sarajevo. Não tivemos outra opção a não ser pegar um táxi. Uma discussão quando nos levaram num albergue onde estavam indo os noruegueses, e o lembrei de que o acordo era outro. Quando nos afastávamos do centro velho, resolvemos mudar de ideia – para desespero do motorista- e pedimos para nos deixar no centro que nos viraríamos  Muita gente deve achar loucura ir procurar lugar para ficar as seis da manha. Ok, concordo que os quinze minutos de caminhada foram perrengue, mas se vissem o quarto que achamos (sorte ou faro?) qualquer um ia querer trocar seu hotel ou albergue por ele!! Muito show, uma casa antiga 4 quadras do centrinho, quarto gigante, tudo limpo, muito bacana.

Ja na nossa chegada nos encantamos por Sarajevo. Que cidade bonita, que estilo (mistura de prédios Otomanos e Austro-Hungaros só podia sair algo único!). Difícil imaginar que 15 anos atrás estava em ruínas. A guerra foi feia por aqui, e a cidade ficou sob estado de sitio por quase 3 anos. Um gigantesco túnel foi cavado para que alimento e água pudesse chegar a cidade, pessoas saíssem e soldados se movimentarem. Muita coisa já foi reconstruída, mas os buracos de bala em muitos prédios mostram que as feridas dentro das pessoas ainda estão abertas, muito abertas.

Podem reconstruir, mas marcas vão ficar…

Sarajevo já foi chamada de Jerusalém da Europa, por ter as três religiões monoteístas bem representadas ali. Cristãos Ortodoxos e Católicos, Muçulmanos e Judeus. Os Judeus foram acolhidos quando esta região ainda fazia parte do Império Otomano, e haviam sido expulsos dos reinados cristãos de Portugal e Espanha. Viveram pacificamente com as outras crenças ate a segunda guerra mundial, quando fascistas croatas passaram a persegui-los, e com o domínio da Alemanha tudo se desandou, e vocês sabem a triste historia. Hoje existe uma pequena comunidade judaica, mas muito reduzida considerando o tamanho que já foi. Andamos pelo antigo bairro judeu, sinagogas, que ficam quase ao lado das Igrejas e Mesquitas. Alias as mesquitas são a maioria, e os minaretes dão todo um charme para o lugar. O centro velho e formado por calçadões, lotados de cafés, restaurantes e lojas. Em muitas paredes a foto do Tito, ex-líder da Iugoslávia, era exposta com orgulho e saudosismo, mostrando que assim como nos outros países da região, ele e muito querido. A continuação da Ferhadija, um dos principais calçadões, e a Tita, onde já iniciam as lojas e cafés mais moderninhos. Tava muito movimentado, cheio de turista (até demais), cidade muito viva. Mas algumas cenas nos chocavam. Num entardecer vimos algo refletir no topo das colinas verdes ao redor da cidade, e ao repararmos melhor, eram varias criptas! Tudo virou cemitério. Qualquer metro quadrado serviu para enterrar alguém. No centro, em uma praça publica, crianças jogavam bola entre as tumbas. Inacreditável!  Incompreensível!!

Cristãos

Judeus

Muçulmanos

Que a nova geração seja mais tolerante!

Sarajevo sempre foi uma cidade pobre, estava tentando se erguer, inclusive com os jogos olímpicos de inverno de ’84, mas ai tudo se desandou de vez nos anos 90. Agora, finalmente parece ter achado seu caminho, mas as marcas continuam. Estávamos ali no primeiro dia de Ramadam. Fomos a uma mesquita no anoitecer, para ver o final do jejum diário, e acabamos ganhando doces também. ( A Bibi escreveu um artigo muito legal sobre o Islamismo.  http://tambemsai.wordpress.com/2010/07/10/compreendendo-o-islamismo/ )

Todos estes povos que lutaram na guerra civil, Bósnios-sérvios (cristãos ortodoxos); Bósnios-Croatas (cristãos católicos) e Bósnios-Muçulmanos são da mesma “raca”, os Eslavos. Portanto esta historia de limpeza étnica quando os sérvios mataram os muçulmanos e a maior balela! Foi uma guerra ou politica ou religiosa, com cristãos massacrando muçulmanos em plenos anos 90, inclusive com campos de concentração!  Se um louco muçulmano mata gente por algum motivo e por causa da religião,  mas se e um cristão, sempre tem que inventar outro motivo. Não estou defendendo que todas são guerras religiosas, muito pelo contrario, mas não se pode usar dois pesos e duas medidas. Porque todos lamentam só o 11 de setembro e não o que aconteceu na Bósnia?

A Bósnia respira conflitos, e foi ali que se iniciou a primeira guerra mundial, apos o assassinato do Franz Ferdinand (não a banda!) herdeiro do império Austro-Húngaro, a guerra foi declarada contra a Servia e a partir dai as alianças da WWI foram se formando. No exato local do disparo fizeram um pequeno museu a respeito da época Austro-Hungara de Sarajevo. Caminhamos bastante pela cidade, que e relativamente pequena. A rotina de sorvete e o prato tipico que parece um pão com linguiça e cebola estava incorporada ao nosso dia a dia.

Nosso próximo destino ficava na parte Herzegovina do pais. Fomos de trem, pelas belas e muito verdes montanhas. O trem e cedo, mas vale o esfôrço de sair da cama ao amanhecer. São curvas e tuneis intermináveis  numa super paisagem ate chegar em Mostar. A cidade ficou famosa por uma bonita ponte, que foi destruída nos conflitos, dividindo a cidade entre Bósnios-Croatas e Bósnios-Muçulmanos (eles lutaram lado a lado no inicio da guerra contra os Bósnios-Sérvios, mas depois acabaram guerreando entre si). Cada um para um lado da cidade. Se por acaso estivesse do lado errado, azar o teu, ficaria assim por anos, ate o conflito acabar. A cidade foi posta ao chão, mas assim como a ponte, foi reconstruída. O turismo (a proximidade com a Croácia facilita) tem trazido dinheiro para a região, mas o assunto da guerra ainda e um tabu. Novamente obtivemos poucas respostas para nossas perguntas.

Cidade e bem pequena, com um bairro antigo legal, mas muitas lojinhas e muita gente. O calor tava grande e fomos tomar banho de rio (que e gelado!) bem próximo a ponte histórica. Ha, não preciso nem falar que conseguimos uma casa super legal, né?! Caminhamos só mais pelo final de tarde, quando o sol já estava mais fraco. Apesar da altura, alguns locais pulam da ponte em troco de algumas moedas. Jantamos de frente para o rio, tentando entender muita coisa que aconteceu ali, mas como nos falaram, só quem estava ali para saber, pois por mais detalhes que se tenha, e impossível de imaginar.

A destruição da ponte na foi só física, mas simbólica. Que a reconstrução também seja!

Mostar

Nosso ônibus era de Mostar para Split-Croácia, mas parou uma hora em Medugorje, um pouco mais ao sul. Cidade de grande peregrinação cristã, pois supostamente Nossa Senhora apareceu para algumas crianças ali nos anos 80. Assim como nas cidades de Lourdes e Fátima, a Igreja Católica ainda não confirma a aparição. Os fieis só aumentaram com a guerra, pois mesmo estando na área de conflito, a região foi surpreendentemente muito pouco afetada.

Na fronteira com a Croácia foi rapidinho e logo estávamos passando por lagos no meio de montanhas ate chegar no famoso litoral croata. A estrada ia beirando o mar, num relevo todo recortado ate chegarmos a Split. Rodoviária, estação de trem e porto são todos juntos. Desistimos de passar a noite ali ao ver o calor, a muvuca e os preços não muito amigáveis. Tinha alguns nomes de ilhas, mas o planejamento final ainda estava para ser feito.

A Croácia e a sensação do verão europeu. Escutamos de varias pessoas que a Grécia e coisa do seculo passado, que já faz 10 anos que todo mundo só quer vir para a Croácia (imaginem com a crise e os protestos atuais da Grécia). Deu para perceber, tava tudo lotado, ferry cheios (principalmente italianos), cartazes de festas. O barco que passa em diversas ilhas durante uma semana estava descartado. Queríamos achar um lugar sossegado, então foi fácil descobrir as ilhas que não iriamos – as das festas e Djs. Algumas horas navegando entre as ilha croatas, já anoitecia quando chegamos a Korcula. Tínhamos ouvido falar bem da ilha, mas ainda não tinha a paz que buscávamos. Tinham me recomendado duas ilhas mais afastadas, bem para dentro do Mar Adriático. O mesmo barco estava indo para uma delas, Lastovo (a outra era Bisevo), e ao confirmarmos as informações sobre a ilha com um jovem casal italiano, seguimos viagem. O tempo passou rápido pois fomos conversando com o casal, que ate tentou arranjar uma casa com a pessoa que tinha alugado para eles. Não deu certo, mas na frente do porto tinha um centro de informação, que com um telefonema arranjou um apartamento de frente para o mar, e com um precinho especial! Trocamos contatos com os italianos e depois de jantar, fomos dormir sem colocar despertador para o dia seguinte!

Nos surpreendemos ainda mais no dia seguinte, quando pudemos desfrutar da vista do lugar! Fantástico! Na frente da onde estávamos não tinha praia, só uma “lage” com as pedras e aquele mar azul. Aproveitamos bastante ali, e não tínhamos horário para nada. Um dia fui caminhar para uma vila ali perto, onde já tinha um movimento um pouco maior, mas que mesmo assim se restringia a umas casas, um hotel e uma duzia de barcos. Um final de tarde incrível, e com o sol se pondo na frente da nossa janela. Caminhamos também para o outro lado, onde tem uma enseada calma, no final de uma pequena trilha. Encontramos com os italianos para um happy hour com o sol se pondo e combinamos de passear um dia. Fomos no ponto mais alto da ilha, com vista para toda a região e ilhas. Passamos por enseadas tao fechadas que ate pareciam lagos. Todas elas tem pelo menos um barco a velas. Íamos parando e mergulhando, gastando mais tempo nas que gostávamos mais. A noite resolvemos fazer um peixe na grelha e camarão com macarrão e a festa foi ate tarde. Estávamos de ferias, e nossa maior preocupação do dia a dia era ir ate o mercado para comprar alguma coisa para comer. O tempo ia passando devagar, cada dia íamos para uma praia diferente, mergulhávamos das pedras, caminhávamos e o tempo foi passando. Nos despedimos dos nossos amigos italianos, e nos incomodávamos com o fato de que a viagem estava no final. Algumas vezes quando caminhava vinha o filme da viagem na cabeça, e pensava, “porque voltar”?! Conversamos um pouco sobre o assunto também. Por mais que tentássemos curtir o presente, a proximidade da data nos atrapalhava.

Vista do quarto, da varanda ainda tinha outra!

Ok, acho que deu para ter uma ideia da “nossa” ilha..!

Bibi com barquinho que alugamos!! hehe

Ficamos muito contentes com a nossa ilha. Era bem o que buscávamos. Alugamos uma scooter e percorremos as poucas estradas que existem lá. Bahias e lagoas azuis, muitas delas desertas. O que é a paisagem da Croácia…

Nossa ida para Dubrovnik não foi tao simples como imaginávamos, pois não tinha ferry direto para la. Tivemos que ir para Vela Luka, esperar os poucos ônibus e muitas curvas ate Korcula, atravessar de ferry até Orebic e seguir pela península, e bonita costa toda recortada ate Dubrovnik. Mesmo a viagem não sendo curta, o corredor do ônibus estava lotado de pessoas viajando a pé. Na rodoviária tinham varias pessoas oferecendo quartos, mas logo vimos que muitos deles eram bem afastados. Conseguimos um num casarão antigo, muito gostoso e com o quarto todo reformado. Estrategicamente entre a cidade velha e o ferry que pegaríamos para ir para a Itália. Temos visto muitas cidades velhas, mas Dubrovnik e muito linda! Murada, na beira do mar, realmente impressionante. Ainda tivemos a sorte de ser lua cheia na segunda noite que fomos la. Andamos pelas ruazinhas meio que sem direção, tomamos sorvetes para aliviar o calor e curtimos uma musica ao vivo. O lugar tava cheio de gente, mas lotado mesmo. Tava tendo um festival de verão, com atrações, musica e programações diferentes. Fomos numa exposição fotográfica chamada War Photo Limited  (  http://www.warphotoltd.com/ ), que achávamos ser sobre a guerra dos Balcãs. Na verdade também era, tinha uma cobertura super boa sobre os tristes eventos da região (Servia X Bósnia e Croácia, MacedôniaXAlbania…), mas era ainda mais completa. Tinham bonitas e horríveis fotos sobre Paquistão, Afeganistão, Iraque, Líbano X Israel, Palestina X Israel, Sudão, Serra Leoa, Uganda (e outros lugares com crianças soldados), Maoistas da Índia, tudo com as informações dos pontos de vista dos fotojornalistas que acompanharam estes eventos. Muito impressionante e chocante.

Lua cheia em Dubrovnik

Mais alguns cafés, cervejas e restaurantes e estávamos nos despedindo de Dubrovnik. Embarcamos no ferry para Bari, na Itália, e a oficial da imigração fez até piada com o passaporte da Bibi, que já ta com todas as folhas lotadas (eu fiz um novo na Malásia), e tem que procurar lugar para estampar. Ficamos no deck, alem de mais barato, as cabines já estavam lotadas mesmo. A Bibi capotou no chão, entre um banco e uma mesa, só com um cobertor e lençol, e eu tive que acorda-la na hora que chegamos. O que um bom tempo de viagem não faz!!!haha. Eu acordei um pouco antes, com o nascer do sol, e fiquei tomando um cafe e olhando nossa lenta aproximação até a Itália!!

Confortável!

O tempo parou?

Como tudo conspirava para não pegarmos o barco não o pegamos. As noticias mostravam que os protestos pela separação do sul do Iêmen se intensificavam com a proximidade do dia da independência (antes eram 2 países  que se unificaram em 1990). Chegou a ter ate alguns atos de violência  O tempo mudou bruscamente, e chegou a chover um pouco, mas o grande problema era o vento. Passar 14 hs num barco com mais de 300 vacas com tempo ruim não parecia muito agradável  isto se o barco saísse.  Não podíamos esperar mais, tínhamos que acabar com o “Groundhog Day” (filme dia da marmota, onde todo dia acontece a mesma coisa), então pegamos um avião de Djibuti para Sanaa.

Desde a primeira vez que tinha visto uma foto da Old Sanaa, sabia que um dia iria para la. De repente estava eu chegando na capital do Iêmen. Sobrevoando me pareceu bem mais moderna que esperava,  afinal se trata do mais pobre dos países árabes. No aeroporto já tivemos o primeiro choque cultural, quando vimos que todos usavam seus turbantes e grandes facas na cintura. Por outro lado, no estacionamento tinham bons carros, e uma impecável avenida de 4 pistas que nos levou ate a parte velha da cidade. Saímos da pista que havia ficado abaixo do nível da cidade para entrar num dos acessos da cidade velha. Fomos andando por ruas estreitas ate que o taxista falou que o carro não passava mais. Fomos a pé, andando entre aquelas construções  com uma meia luz, muito show. Fomos num hotel indicado mas resolvemos olhar outros ao lado. Os preços não eram dos melhores, mas como já era tarde resolvemos ficar num deles. Hotel antigo, numa construção antiquérrima, mas cheia de estilo. Portas de um metro e meio e pé direito do quarto de uns três metros e meio. Vitrais em todos os quartos. Muito bacana.

Predio em Old Sanaa

Dia seguinte tomamos café cedo e partimos para explorar Old Sanaa. Muito bom andar sem destino, só seguindo pelas ruelas. As construções a primeira vista parecem todas iguais, o que torna fácil de se perder. Que bom! E a melhor forma de conhecer um lugar. Tínhamos combinado de fazer o check out as duas, então voltamos correndo para o hotel, pegamos nossas mochilas, e caminhamos ate Tahrir, no inicio da cidade nova. Aqui, diferente da maioria dos lugares, a parte nova da cidade e mais barata. Não demoramos para achar um hotel bacana muito barato. Fomos na região das embaixadas pois o Guru precisa de visto para entrar em Omã, nosso provável próximo destino. Brasileiros só carimbam na fronteira, mas foi bom para confirmar a informação  Legal passear na parte mais nova da cidade. Mesmo não sendo a minha preferida, faz parte da cultura local. Mesmo os táxis sendo muito baratos, resolvemos pegar micro-ônibus  só pela diversão.  Teríamos que fazer conexão e tudo, e ninguém falava inglês  muito menos nos falávamos árabe. Foi muito divertido! Legal de ver a hospitalidade das pessoas. Mesmo sem falar uma palavra em inglês vinham nos ajudar, se empenhavam. Nossa ideia rendeu boas risadas, tanto nossas quanto deles. Voltamos para a parte velha da cidade para curtir o final de tarde na região de um grande mercado. Muito show!

Detalhes

Nosso primeiro dia foi tao corrido que nem deu tempo de ir na policia nos registrar. Então no outro dia foi a primeira coisa que fizemos. Só o visto não adianta, tem que ir la, deixar copias do passaporte e visto, alem do endereço do hotel. Burocrático mais simples. Voltamos para as embaixadas e o Guro conseguiu convencer em receber o visto na hora e não em 2 semanas como estava propondo. Na embaixada do Iram foram muito atenciosos. Ele solicitou visto aqui e vai retirar em Muscat, capital de Omã. Brasileiro novamente não precisa.

Traje tipico

Devido a não frequência de ônibus e burocracia da policia, resolvemos alugar um carro com motorista para conhecer os arredores de Sanaa. Para isto visitamos varias agencias e negociamos bastante. Acabamos acertando com a agencia recomendada pelo embaixador do Brasil na Etiópia  que entendeu nosso “estilo” de viagem e nos deu vários descontos. No topo do hotel que ficava a agencia tinha um terraço com uma super vista. Tomamos um cafe e ficamos curtindo as chamadas das mesquitas que parecia uma sinfonia. Andamos para o outro lado da Old Sanaa até o portão principal. Subimos num local e ficamos vendo a movimentação do pessoal, alem das rodas de pessoas mascando Khat. Todos se vestem igual aqui. “Saia”, que e uma canga, lenço/turbante e cinto com faca. Para ver se alguém e mais rico não se olha a roupa, joias e sim o estilo da faca. Poucos usam o que chamaríamos de roupas ocidentais. Quando não estão com as roupas típicas estão usando ternos de veludo. Muito estilosos. Outro final de tarde gostoso e beem devagar.

Vista geral de Sanaa

Já tínhamos rodado bastante Sanaa e era hora de conhecer seus arredores. Fomos com nosso motorista ate um palácio que fica a uns 40 km do centro de Sanaa. Ele fica em cima de uma pedra. Bonito de se ver e com uma super vista la de cima. Passamos por diversas vilas, Thulla, Hababah eKawkaban, de onde andamos montanha abaixo ate Shiban. Todas com suas construções antigas, suas cisternas e historias. Em muitas delas existiam os bairros judeus, e as estrelas de Davi ainda estão nos vitrais e portas ate hoje. Os judeus do Iêmen também foram retirados numa super operação de Israel, chamada ” Operação tapete Magico”, e foram levados até a terra prometida. Algumas famílias judias ainda vivem em Sanaa.

Palacio

Sanaa e uma das cidades mais antigas do mundo, com povoamento constante. Dizem que foi construída por um dos filhos de Noé, logo apos o diluvio. Toda esta região foi parte do império de Axum da Etiópia, antes de serem conquistados pelos Árabes Muçulmanos.

Nosso voo para Socotra estava lotado e teríamos que esperar mais alguns dias por aqui. Fomos tentar pegar informação sobre os ônibus para Omã, mas a comunicação foi impossível. Sempre falavam que não tinham ônibus, indicavam outro lugar mas nunca dava certo. Frustrados fomos encontrar com o ED, jornalista canadense que mora aqui, que conhecemos no Couchsurfing. Batemos um papo e fomos ate o apartamento que ele divide com outros jornalistas. Ficamos no terraço  com Aquela vista de Sanaa, conversando sobre o pais e viagens. Ele e recém formado em Fotojornalismo, e morou os últimos 4 anos em diferentes países do oriente médio  Muito bom o bate papo, e pudemos ter um pouco mais de informações  pois a  dificuldade da língua estava nos privando disto. Ate então todas as informações que tínhamos era de pessoas ligadas ao turismo.

Fomos ate a policia pegar autorização para viajar por terra para Omã. Tudo com data certa e devidas copias que ficam nos controles ao longo da estrada. Fomos ate a agencia acertar mais um passeio, pois conseguimos marcar o voo só mais para frente.

Desta vez fomos para sudoeste de Sanaa, uns 100 km de viagem, passando pelas Montanhas Haraza ate chegar em Al-Hutyaib, Al-Hajarah e a fantástica Manakaha. Cidadezinhas paradas no tempo, penduradas nas montanhas. Em todas estas cidades encontrávamos alguém que falava inglês, e ficávamos conversando durante as caminhadas.

O tempo parou por aqui!!Mais de 3000 anos de ocupacao continua...

Que lugar!!

Toda a burocracia policial tem um porque. Tirando o sul que tenta uma independência de forma civilizada, existem 2 áreas de conflitos no Iêmen. Ao norte, perto da Arabia Saudita, na região de Sadah, existe uma guerra, entre o governo e grupos radicais islâmicos  Não se pode nem sair de Sanaa na estrada que leva a este local. Diariamente víamos aviões de guerra saindo de Sanna. Dificil saber o que acontece, pois reportes também são proibidos naquela região  mas provavelmente o governo esta bombardeando os extremistas, que tem apoio de outros países islâmicos  Já nas Montanhas Hadramout, rebeldes ligados a Al Qaeda tem feito guerrilha, e o governo tem dificuldade de controlar. São locais muito longe de onde vou passar, por isto não se preocupem. Turistas desavisados ou imprudentes foram vitimas destas guerrilhas. Poucos meses atras houve sequestro seguido de mortes de turistas alemães  Estes grupos radicais são contra o “ocidente’, por isto tem turistas como alvo, alem da mídia que atraem. O Iêmen teve um grande numero de participantes nos atentados de 11 de setembro.

Iêmen é um pais pobre, com um povo super tradicional e hospitaleiro. Existe uma previsão de terminar a água potável da região em poucos anos, o que causa um desespero geral na nação  O pouco petróleo que ainda resta também está no fim. Pena um país tão interessante culturalmente e bonito naturalmente, ser tão instável.