Níger não é um país estampado nos cartazes da agencias de turismo. Muitas pessoas se confundiriam perguntando, “Não é para Nigéria que você vai?”. Outros tantos não saberiam definira a nacionalidade de quem nasce no Niger (Nigerino). Um dos países mais pobres da Africa, frequentemente está em ultimo lugar nas listas de IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) de todo o mundo. O que eu fui fazer lá? Me surpreender!
Eu viajava numa das principais estradas do país, rumo a capital, Niamey, mas parecia que me dirigia sentido ao interior. Um estrada muito simples e de má qualidade, pouquíssimas cidades, que na verdade eram uma ou outra vila, mesmo eu estando numa das regiões mais populas do país.
Quando atravessamos o Rio Niger, entrando na capital, os quatro Fulas (uma das etnias locais), altos e magros, não esconderam a alegria. Falavam sem parar e gritavam para o motorista orientações de onde queriam descer. Eles dividiam o ultimo assento do ônibus comigo, o que mais sacolejou durante a viagem. Todos os outros passageiros viravam para ver o que diziam. Eles estavam voltando de uma temporada de trabalho em Freetown, Serra Leoa. Não sabiam dizer ao certo quantos meses estavam fora. O bastante um comentou, mais de meio ano afirmou o outro- sem comunicação com a família. Grande parte da população do Niger esta na região rural e vive de subsistência. As poucas dezenas de dólares que conseguiram guardar mensalmente faria grande diferença no dia a dia de seus parentes. Antes de descer um deles me desejou boa sorte na minha jornada. Minha vontade era de dizer, fique com a sorte, você precisa mais dela do que eu. Mas ele saiu com seus amigos feliz da vida, e ficou abanando quando eu dei uma espiada pela janela lacrada por causa do ar condicionada que já não vencia o calor lá de fora.
Alguns quilômetros adiante, já dentro da cidade, o ônibus parou na “moderna” estação. Não existe o sintema de rodoviária na maioria dos países da África, cada companhia tem seu terreno. Muitas vezes parece um terreno baldio, cheio de lixo e empoeirado. Eu havia embarcado num destes em Ouagadougou, Burkina Faso, que era exclusivo da Sonef. Em Niamey, sede da empresa, eles tinham dois terminais grandes, murados, bem estruturados para os padrões locais.
No meu plano inicial, eu passaria uns dias na capital e seguiria ao sul, onde faria uma ou outra parada antes de chegar ao Benim. Mas uma semente havia sido plantada, meses antes, em um bate papo informal em Florianópolis. Meu amigo, Edson Walker, grande viajante que já esteve no Niger ficou empolgado com meus planos de viagem. Primeira coisa que perguntou é se eu iria para a histórica Agadez. Não que eu não tivesse cogitado, mas não parecia fazer muito sentido eu me aventurar quase mil quilômetros sentido ao Saara para depois retornar. Cheguei a estudar uma ida até o Chade para voltar de avião, mas teria que passar por cidades na fronteira da Nigéria onde tiveram recentes atentados do Boko Haram. Estava descartado este trajeto.
Eu tentei colher o máximo de informações possível, entender como estava a situação. O wikitravel dizia que qualquer viajante que tentasse chegar a Agadez seria mandado de volta no primeiro ônibus no sentido contrario, o que poderia demorar 24 horas. Eu fiquei sabendo de um cara que tinha feito o trajeto poucos meses antes, e disse que tudo estava ok. As pessoas em Niamey não sabiam informar direito, era tão longe, uma realidade tão diferente da delas. Teve rebelião dos Tuaregues, as coisas estão agitadas nos últimos anos por lá, um jovem me disse, quando tomava um café (ultimas décadas na verdade!). Outro recomendou eu entrar em contato com a policia ou exercito. Mais fácil foi eu perguntar no guichê onde vendem passagem para lá, afinal de contas, com ônibus diários, sabiam exatamente como estava a região. Um rapaz entusiasta me encorajou. Está bem tranquilo, só não vá mais ao norte. O pessoal não sabe o que fala… A proibição de estrangeiros caiu em Janeiro, pode ir tranquilo. A falta de informação é cruel, mas a sua confiança me contagiou e comprei um bilhete. O ônibus partiria as quatro da manhã. Sai para perambular pela cidade. Haviam me recomendado o museu nacional, um dos mais completos do Oeste da Africa, mas com pouco tempo eu preferi curtir a cidade como um todo. Fui na imponente mesquita principal, financiada pelo Kadafi, onde diversos jovens jogavam bola nos seus arredores. Futebol é um dos esportes mais populares do Niger, talvez só superado pela “Luta Tradicional”. Eu havia me informado onde tinha um ginásio da luta local e fui la para conferir se estavam treinando. Infelizmente lá só acontecem as competições. Gostaria de ter visto um ou outro combate, mas não tinha nenhum agendado. É uma especie de Wrestling, onde vence quem derruba seu oponente com os dois ombros no chão. Nada de tatame, tudo num piso empoeirado, acompanhado de musica e rituais tradicionais. Dei uma olhada nos mercados, no Rio Niger, onde as pessoas lavam a roupa mesmo no centro da cidade. Queria procurar pelos famosos morcegos da região e ninguém entendia direito quando eu perguntava por informações. Mas quando escureceu eu entendi porque, eles estavam por todos os lados, sobrevoando a cidade e dando seus rasantes. Com o anoitecer eu, com minha mochila, sabia que seria uma presa fácil. Não para os morcegos, mas para algum oportunista que me visse dando mole.
Peguei um táxi coletivo para a estação de ônibus e fui comer alguma coisa no pequeno mercado improvisado ali na frente. Os preços dos hotéis são muito caros na capital do Niger, não valeria a pena para poucas horas. Descansaria na rodoviária mesmo.
Comprei um baguete e quatro espetinhos de bode (100 CFA/0,15EUR cada) e me sentei num banco. Um rapaz puxou papo em inglês. Aparentava ter uns vinte poucos anos (depois descobri que tinha quase trinta), e falava inglês relativamente bem. Era de Burkina Faso, mas não morava lá fazia tempo. Estava sempre se mudando atras de trabalho. O ultimo foi no porto em Benim, se orgulhava de ter mandado um bom dinheiro para casa. No inicio fiquei meio atento, na defensiva, mas depois baixei a guarda. Ele me elogiou: “você é gente boa, me aproximo de muitos brancos que nem querem conversar”… “Depois de um tempo de conversa ele peguntou: “Onde você mora mesmo? Brasil? Tem trabalho bom lá? Se me levar para o teu país posso trabalhar em qualquer coisa…”. Ele dizia que estava indo para a Argélia ou Líbia. Dizia ter empregos bons lá. Eu brincava perguntava se ele ia mesmo para lá ou se daria uma esticadinha até a Europa. Ele negava, dizia ser muito perigoso, “Minha família depende de mim!”afirmava.
Ele passou uns dias sem dinheiro, e até enviarem para ele completar a viagem, ficou vivendo na rodoviária. Me mostrou o salão de espera, três andares onde as pessoas descansavam em esteiras,o banheiro e chuveiros. “Precisa tomar banho depois de alguns dias, te da força”, afirmava. Na sala de espera, o primeiro nível era para as mulheres e os outros dois para os homens. Ao contrario dos ouros países que passei nesta viagem(e os que iria também) a maioria esmagadora da população do Niger é Muçulmana.
Garanti minha esteira e dei uma esticada. Achei que iria dormir, mas tinham muitas pessoas querendo conversar. Muitos curiosos apareceram e meu novo amigo servia de interprete. Queriam saber da minha vida e eu da deles. Eramos todos viajantes, mas cada um com um proposito diferente. A impressão que fiquei é que todo mundo que encontrei no Niger estava em transito. Já sobrecarregado de informação e de duras histórias de vida, cochilei. Uma hora antes da saída do ônibus um funcionário acordava todo mundo, puxava as esteiras e tocava uma musiquinha irritante enquanto iluminava a todos com sua lanterna. Me despedi de algumas pessoas, mas muitos outros seguiriam comigo, no mesmo ônibus, rumo a Agadez.
Aproveitei as primeiras horas para dormir, ou pelo menos descansar. Ainda escuro, e sem a influencia do sol forte, o ar condicionado ainda funcionava. Vesti até uma jaqueta corta vento e um lenço no pescoço. As estrada era ok, mas o ônibus lotado tinha pouco espaço para as pernas. Na primeira parada para controle de passaportes fiquei tenso. O oficial subiu no ônibus e olhou o passaporte e identidade de todos. Ficou procurando meu visto e de onde eu era. Perguntou para onde eu ia e me devolveu o passaporte sorridente. “Bon Voyage!”. Mas nem todos tiveram a minha sorte. Muitos tiveram que descer e entrar em uma tenda improvisada. O motorista esperou, impaciente mas esperou, muitas pessoas serem extorquidas em cada uma das paradas do exercito. Em duas delas me mandaram descer. Fui na tenda, somente verificaram o passaporte, anotaram uns dados e me liberaram. Outra pessoas me perguntavam o quanto eu tinha pago, e se surpreendiam quando falava que nada. Nem todos tinham a mesma sorte, e muitas pessoas iam deixando suas economias pelo caminho.
Numa das paradas, tentando entender a situação, um senhor saiu em defesa dos oficiais. “Eles pagam dinheiro para serem liberados porque os documentos não estão em ordem. O meu está e eu nunca tive que pagara nada…”. No ponto de vista dele os policiais estavam sendo generosos em deixar o pessoal seguir viagem, era apenas uma troca de favores.
Por falar em troca de favores, numa parada mais longa decidi comprar um pedaço de frango e batatas fritas. Meu amigo estava comigo e não conseguiria comer com ele olhando. Comprei o mesmo para ele. Em todas as outras paradas ele vinha com alguma coisa para mim, fosse uma laranja, um saquinho de água ou qualquer coisa que fosse comer. Vontade de dizer, fique para você, guarde, não precisa. Mas não, na África a reciprocidade é muito forte. Você ajuda e é ajudado, você sorri e faz amigos. É uma lei natural, ninguém sobrevive sozinho, um depende do outro e todos sabem disto.
A estrada foi se deteriorando e logo era mais fácil trafegar pela areia que pelos buracos. Vez ou outra dava para avistar um caminhão tombado na beira da estrada. Paisagem monótona, só mudava quando passávamos por algum vilarejo ou por pastores. Alias era minha alegria quando dávamos uma parada um pouco mais longa. Olhar as diferentes casas, pessoas, estilos, parecia um sonho.
Já havia passado das onze da noite ( tínhamos saído as 4 da manhã) quando teve um controle “pente fino”. Olharam todo o bagageiro do ônibus e analisaram minunciosamente os documentos. Eu havia sido surpreendido positivamente por cada sorriso e gesto acolhedor de cada oficial que encontrei no Niger, mas eu ainda parecia não acreditar. Seria tudo tão fácil? Neste ultimo controle disseram que ficariam com meu passaporte. Eu disse que não podia me separar dele mas insistiram. É para o registro, esta tudo bem. Amanha de manhã você pode buscar na delegacia, fique tranquilo. Procedimento normal. Já estava tão exausto que concordei. Poucos quilômetros adiante entramos em Agadez.
Pequei uma moto e fui até um hotel que haviam me indicado. Passamos por ruas estreita, casas feitas de barro, num verdadeiro labirinto desta cicade do seculo 11. O hotel, bem decadente, aparentava ter tido seus dias de gloria, mas estava em pedaços. Pedi o quarto mais barato e capotei.
Acordei assustado, com o despertador estridente. Havia dormido profundamente, e acordei com a sensação de que tinha perdido a hora. O ventilador não vencia o calor. Ainda era cedo, mas o sol já estava mostrando quem mandava naquela região. Fui tomar um banho e me deu uma tristeza. Fazia tempo que alguém não passava uma água por ali, de tão imundo que estava o lugar. Falei um um funcionário que regava umas poucas plantas no jardim interno do hotel. Pedia informação sobre como chegar à delegacia de polícia. Ele chamou o irmão do dono do estabelecimento, o jovem Mohamed. Com carra de sono, ele pediu cinco minutos e disse que me acompanharia. Lavou o rosto e enrolou um cigarro de maconha. Me contou da época que o hotel era frequentado por turistas europeus. Mostrou fotos de caminhonetes que atravessavam o Saara até chegar em Agadez na época que seu pai era vivo. Era um ótimo negocio, dizia (ele nem tinha nascido). Um italiano construiu este hotel. Mas depois da rebelião dos Tuaregues, somente nigerianos se hospedam aqui.
Peguntou se eu queria ir de táxi, mas como fiquei sabendo que era próximo, resolvi ir a pé mesmo. Ele me olhou com uma cara de “então tá”, e logo percebi porque. Sol fortíssimo, poucas sombras, mas foi bom para ir me localizando na cidade. Ele parou para comprar um perfume importado. Muito bom, dizia, oferecendo para eu cheirar. Muito dinheiro em Agadez, uma cidade muito rica. Algumas quadras depois chegamos a uma especie de quartel, onde indicaram o local onde deveríamos ir. Alguns soldados batiam papo numa varanda e pediram para eu esperar. Esperamos, esperamos e o Mohamed cansou. Vamos comer algo, depois voltamos, ele dizia. Eu estava aflito por estar sem meu passaporte e disse que esperaria por ali. Ele saiu voltaria depois para me buscar. Um bom tempo passou, não sei ao certo quanto, pois estava sem relógio. Mas foi tenso, demorado psicologicamente. Os soldados me convidaram para sentar, mas eu fiquei encostado numa pilastra, de onde conseguia ver a rua e me distrair um pouco.
De uma hora para outra chega um carro relativamente rápido, levantando poeira do chão de terra. Todos se levantam e batem continência. Era o oficial da noite anterior. Ele bate nas minhas costas e diz para eu acompanha-lo para uma sala. Um outro soldado vem junto e fecha a porta. Será que cairia numa armadilha? Onde estaria meu passaporte? Já tinha passado por tantos controles e parecia que eu ainda não acreditava que tudo fluiria tão bem. Ele apenas registrou meus dados, anotou onde eu estava hospedado e quantos dias ficaria por ali. Me proibiu de passar do limite norte da cidade. Aqui você está seguro, mas tem muitos problemas por lá. Infelizmente não seria desta vez que eu conheceria as Montanhas Air, que ficam no meio do deserto e tem o tamanho de uma Suíça. Tampouco o famoso Tenere. A maioria das vilas e acampamentos tuaregues também estavam off-limit para estrangeiros, somente com uma autorização especial, transporte, guia e escolta armada, fora do meu orçamento e bom senso.
Fiquei batendo papo, me serviram chá, e o Mohamed apareceu. Sinalizei que tudo estava ok e fomos caminhar pela cidade. A cidade é toda plana, com construções térreas e uma ou outra de dois andares. O minarete da antiga mesquita tem apenas 27 metros mas pode ser visto de longe. Caminhamos pela cidade antiga, mercados e fomos conhecer o interior da mesquita.
Quando o sol estava insuportável paramos num restaurante para comer e bater papo. Pronto para descansar, o Mohamed me convidou para voltar para o hotel. Ele ligava para amigos que iriam fugir do calor no seu quarto com ar condicionado. Beberam cerveja e fumaram, enquanto cantavam ao som de violão e batuques, musicas de “Azawad” (liberdade). Acompanhei um pouco para não fazer desfeita, mas depois parti sozinho para explorar mais a cidade antiga.
Alguns vendedores insistiam para eu entrar em suas lojas. Belos artesanatos e a famosa “Cruz de Agadez” eram os primeiros itens a serem oferecidos. Um grupo de mulheres entravam cantando em frente ao Palácio do Sultão. Parecia que teria uma grande festa. O Sultão de Agadez é uma figura importante, como que um governo paralelo. Mostra um pouco da importância que a cidade já exerceu (1449 já era um sultanato), quando estava numa das principais rotas de conexão entre a África e a Europa. Rivalizava com Timbuktu, e sua imponência ainda pode ser observada na arquitetura entre as ruas empoeiradas.
Quando o Mohamed não estava com seus amigos ou com prostitutas nigerianas, ele saia para dar umas voltas comigo. Me levou para diversos lugares de moto, sempre sem me cobrar nada (também me deu presentes antes de ir embora). Parecia orgulhoso de mostrar a região, alem de me mostrar para seus amigos. Eu não deixava de ser um troféu, sei lá porque. Fomos no mercado de animais, uma das paradas indispensáveis para quem esta vindo ou voltando para o deserto. Tuaregues negociavam cabras e mantimentos. Cordas e camelos eram vendidos na parte sul do terreno, no meio de muito lixo e poças de água.
Um jovem dromedário lutava com seus donos para não ser carregado, mas não teve jeito, torceram seu rabo, seguraram sua mandíbula e patas e derrubaram. Nos arredores era fácil de ver dromedários sendo puxados por tuaregues com vestimentas tipicas e espadas. Uma verdadeira viagem no tempo!
A curta temporada de chuva tinha sido mais forte que o esperado. Tijolos de barro que estavam prontos para serem utilizados pareciam estar derretidos. Nos subúrbios, algumas vezes pude observar caminhonetes lotadas. Eram os traficantes de pessoas que levariam diversos sonhadores para a Líbia, para quem sabe chegar até a Europa. Meus amigos da noite em Niamey provavelmente estavam entre eles. Era final de Julho e e nem sabia que a crise da imigração na Europa estaria para se agravar. A histórica rota comercial transaariana estava mais viva do que nunca, mas agora o comercio mais lucrativo era de pessoas. Enganasse quem pensa que não existem estrangeiros em Agadez. Não tem mochileiros ou turistas, mas existem representantes de todos os povos da África sub-saariana, prontos para encarar uma longa viagem pelo Saara. Não são os amantes de off-road que um dia se deliciavam por estas terras. São pessoas que acham que passar por bandidos, guerrilhas e Al-Qaeda são problemas pequenos da vida quando comparado ao seu dia a dia. Ficar sem comer também não é novidade para ninguém por ali.
Viagens longas são reflexivas e demorou um pouco para digerir tudo que eu havia visto e vivido. A raiva do mundo se transformava em esperança quando eu fui adotado por um grupo de tuaregues que me entupiram de comida e de perguntas durante a longa viagem de volta para Niamey. Foi só eu elogiar (por educação) uma barra gordurosa de queijo de cabra que quase fui obrigado a comer um quilo dela. Pouquíssimos postos de controle na volta, mas nem por isto a viagem foi mais curta. Passando perto da fronteira da Nigéria, eu sabia que meu próximo destino estava por ali. Mas não podia arriscar descer na escuridão num vilarejo onde sabidamente não existiam hotéis. Fui até Niamey, onde dormi novamente da estação de ônibus. Exausto não me enturmei muito, cobri a cabeça para ter um tempo só para mim. Queria dormir, mas o queijo de cabra fez efeito, justamente na rodoviária! Temia pela sequencia da viagem, mas nada que não fosse controlado.
Meu plano era pouco antes do amanhecer pegar um táxi coletivo até a estação dos microonibus que vão para o sul. Acabei descobrindo que poderia pegar um o ônibus de longa distancia que passaria por Kouré, caso estivesse sobrando lugar. Dei sorte e embarquei, ainda de madrugada, no único lugar disponível!
O motorista teve que me acordar para eu descer na beira da estrada. Nenhum sinal de vilarejo, apenas duas barracas de madeira onde vendem comida, e um posto de contole da polícia. Tomei um café e fui tentando entender o lugar. Kouré é o nome da região, tem um ou outro vilarejo ali perto e sua fama vem das girafas que vivem soltas por ali. Alguns dos ultimos rebanhos de girafas selvagens do Oeste da Africa. O sol ainda não havia nascido e eu já tinha encontrado algumas pessoas que poderiam me ajudar. Paguei uma pequena taxa num centro de informações e fui procurar os bichinhos. Você pode ir de carro, de moto ou a pé, depende um pouco da sorte para encontrar. Mas a primeira família não estava longe, e pude ficar o tempo que quis caminhando entre elas. No inicio você se empolga, quer filmar, tirar fotos, mas a parte mais legal é quando você relaxa, apenas curte. Caminhar atrás delas e se surpreende quando são elas que te seguem!! Ficar no meio das girafas até enjoar é uma atividade privilegiada. Olhar elas se alimentando, cuidando uma da outra e até galopando com estilo deixa qualquer um satisfeito.
Dei uma olhada nas vilas da região e fui tentar pegar carona para a fronteira com o Benim. Carona na África normalmente significa pagar por um lugar em um transporte. Todos os carros que passavam estava completamente lotados. A fronteira do Benim e Nigéria não estavam tão longe, e quem ia para lá tentava dividir os custos ou ganhar um dinheiro extra. O jeito foi ter paciência e quebrar a viagem em entapas. Primeiro um transporte até Dosso, relativamente próximo dali . Até que não foi tão ruim, tendo em vista que a pequena cidade já foi de importância histórica (grande reinado) e possui um Chefe Tradicional com seu próprio palácio (Djermakoye).
Dali para frente foi numa van lotada, com mulheres com roupas coloridas e cicatrizes no rosto. Homens com seus chapéus tradicionais, carregando galinhas em sacolas e bodes amarrados no bagageiro. Paisagens bucólicas deixavam para trás este país que foi a grande surpresa desta viagem pelo Oeste da Africa. Uma moto por mais alguns quilômetros até a fronteira com o Benim, e o que não foi surpresa foi o tratamento da imigração na saída do Niger. O senhor com cara sofrida me perguntou onde eu gostaria que ele carimbasse no passaporte. Apontei com o dedo um espaço livre para não usar uma pagina nova. Agradeci a hospitalidade, contei como havia me surpreendido com o país. Ganhei um sorriso, um abraço e segui viagem.
Gui,
Você está se aprimorando a cada post. Este foi uma aula de história, geografia e cultura. Viajei junto contigo. Espetacular, e extremamente singular esta etapa. Valeu.
Abraços!!!
Obrigado Marcelo! Na verdade pequei na parte histórica. Tinha muita coisa para contar, mas o dia a dia foi intenso e foquei mais nisto. Realmente foi incrível, a grande surpresa da viagem!
Abraço
Gui,
Realmente, a larga experiência ajuda nesta forma de nos expor a viagem…
Mas só quem vive a viagem, pode nos fazer sentir tuas experiências….
Parabéns !! E sinta-se “culpado” por nos manter viciado nisto…..
Valeu Leo, obrigado cara! Estes lugares nos mostram como o mundo é grande e cheio de lugares interessantes, né?! Vamos ver se mais para frente conseguimos marcar outra viagem juntos!
Abração
Adorei o relato Gui! Um pouco angustiante em alguns momentos… a cruz que você trouxe para mim é de la ne? bj
Sim, foi de lá! A “Cruz de Agadez” tem alguns estilos, em cada oásis é diferente 🙂
Muito bom! Gostei das fotos e da sua narração… Niger é isso: tradiçao, simplicidade, sofrimento e esperança. Povo amigo e hospitaleiro.
Obrigado Diói, amei a região! Você esteve por lá?