Karimabad e o mais próximo de um destino turístico no norte do Paquistão e e fácil entender porque. A vila tem uma super vista para gigantescas montanhas (com destaque para Rakaposhi), ótimas caminhadas, uma forte cultura do hospitaleiro povo Hunza, deliciosa comida, e ainda muita historia.
A região tem muitos hotéis mas quase todos vazios. Todos reclamaram muito que depois do 11/09 o turismo no Paquistão despencou. Os hotéis baratos (2 usd por pessoa) não estavam lotados, mas tinha bastante mochileiros. Encontramos algumas pessoas que estavam no ônibus que veio da China, como o excêntrico figura rara, tcheco de 72 anos (e que já viajou para 155 países!!!), alem do nosso amigo japonês Koich, que encontramos pela terceira vez desde o Quirguistão Como ficamos alguns dias, fizemos novas amizades, encontramos couchsurfer e nos sentimos em casa!
Já que estávamos bem no meio da montanha, tudo era subida ou descida. Não demoramos muito para visitar o antigo forte-palácio da região. Fica no topo da vila, e ficou ativo durante 800 anos, ate que com a chegada da KKH, caíram as monarquias. Os antigos reis receberam títulos simbólicos, mas ate hoje são idolatrados por muitas pessoas. Muita gente não se sente paquistanes por aqui, e sim hunzo. O forte-palácio e muito bonito, e com influencias tibetanas claras. Fácil de associar sua fachada com o palácio Potala de Lhasa. Isto ocorreu porque um príncipe de Hunza se casou com uma princesa de Skardu, região hoje a leste do Paquistão e que antes fazia parte do império tibetano.
Em outras vilas vizinhas existem ainda outros palácios menores, e do outro lado do vale, atravessando o rio, ficava outro reinado, o rival Nagir, oponente de tantas guerras. Verão e época de diversas frutas, mas a especialidade da região são as ameixas amarelas. Misturam na comida, secam, fazem diversos pratos. Aproveitamos para nos abastecer destas frutas para fazer uma das caminhadas mais longas que encaramos na região. Subimos ate o Ultar Meadow, uma pastagem verde la no topo da montanha, atravessando cachoeira, penhascos e muita subida com pedra solta. Já estávamos relativamente alto, portanto num ar rarefeito. O Jonny teve que mostrar bastante superação parecia um filme, mas encarou ate o fim. O visual inacreditável, o caminho desafiador, mas valeu cada uma das 7 horas. Teve gente que descobriu que tem medo de altura ao caminhar pelas “passarelas” na beira do abismo…haha
A Bibi aproveitou para ler, na cama de chá especialmente virada para as montanhas. Passamos bastante tempo largados ali também e as refeições com todo mundo junto era um momento a parte. Nosso prato favorito era o Chiken Karay, que intercalávamos com outros pratos para não enjoar.
Numa de nossas caminhadas o Marco fez um amigo, que deu uma roupa de muçulmano para ele. Já estávamos pensando em comprar, mas como o Ramadan aqui é mega relax, nada de lenço na cabeça para a Bibi, dava ate para sair de bermuda, estávamos adiando. Esta parte de Hunza e de maioria Ismailis também, mas nem todo o vale e assim. Nos horários de reza, e principalmente no horário da ultima (ainda bem de madrugada), e primeira refeições (ao por de sol), as mesquitas cantavam alto, e de forma bem longa. Paralisávamos olhando para o horizonte como se estivéssemos hipnotizados, era de arrepiar!!
Um dia decidimos descer montanha ate a vila de Ganish, na beira da KKH. E uma cidadezinha mega antiga, com casas tradicionais, mesquitas todas trabalhadas em madeira e um lago como “praça” principal. Alguns antigos caravansarais ainda estão la, e a madeira onde os cavalos (ou camelos) eram amarrados continua ali, gasta de tanto ser usada. Fiquei pensando se o Ibn Batuta ou o Marco Polo amarraram seus cavalos ali. Existe um interessante sistema de refrigeração para alimentos, utilizando água gelada da montanha canalizada. Foi o primeiro lugar onde mulheres chamaram a atencao da Bibi por causa da roupa. Ali eles eram sunitas, e o mês sagrado do Ramadan deveria ser respeitado.
Em um outro dia, em vez de descermos, resolvemos acompanhar os canais, andando horizontalmente pela montanha. Passamos por casas de pedra, crianças jogando criket com pá, trabalhadoras no campo com roupas suuper coloridas. Muitas pessoas paravam para conversar, nos convidavam para entrar. Era final de tarde, e o lugar tinha uma magia no ar. A Bibi virou e disse: “sera que não poderíamos vir morar aqui, ou pelo menos passar uns meses?” Eu respondi com um ar de vitorioso: “ue, você não tinha medo de vir para o Paquistão? Não era um lugar perigoso?” Voltamos já estava escuro, andando pelas pequenas vilas e seus simpáticos moradores.
Chegou o dia de partir, mas como nos que comandamos, resolvemos ficar um dia extra, só aproveitando o lugar. Conversando com o Koich, decidimos fazer parte da viagem juntos, já que nos demos bem e nos encontrávamos toda hora mesmo.
De Karimabad fomos para Aliabad e de la para Gilgit, maior cidade da região norte do Paquistão Gilgit funciona como uma capital, alem de ser barulhenta, movimentada e empoeirada. Ah, também havíamos descido bastante, portanto estava beem quente.
Comprei meu novo modelito, e eu com barba já estava passando por paquistanes. Gilgit ja e bem maior, principalmente comparado com as vilas que passamos, mas também não dava para ser chamada de cidade grande. Ainda e um mundo a parte do Paquistao. O esporte favorito no norte do pais e o polo. Mas não e um polo de playboy não, e um polo vale-tudo, onde a porrada come solta. Os campos de polo passaram a ser referencia nos mapas das cidades maiores que passamos ainda na região norte. A bravura não esta só nos esportes. No topo da montanha uma homenagem aos Gilgit Scouts. Formados pelos ingleses, foram os heróis da resistência e luta contra os indianos na disputa da Kashimira. Mesmo em menor numero, conseguiram garantir 30% da Kashimira para o Paquistão mas este assunto eu comento mais para a frente.
Nos arredores de Gilgit ja tem muitas ruínas budistas, mas a maioria dos sítios budistas estão perto de Skardu, no estado de Baltistan, que significa Pequeno-Tibet. Na verdade o budismo chegou na China, e até mesmo no Tibet, passando pelo norte do Paquistão Na região passa o sagrado rio Indus. A Viagem ate Skardu foi bela (como sempre), perigosa devido os desfiladeiros, mas especialmente dolorosa pelo micro-ônibus lotado e horas de duração.
Alem dos lugares de interesse de Skardu, a cidade seria ponto de partida para os Deosais Plains. Juntos com o Koich poderíamos alugar um jipe só para nos, já que não existe transporte publico para la. Depois de muitas discussões (saudáveis) com outros viajantes durante o jantar e uma noite bem dormida, estávamos prontos para negociarmos o transporte. Logo arranjamos um jipe e fomos para o mercado comprar comida para os próximos dias. A Bibi e o Jony compravam frutas enquanto eu fui cercado por locais, onde tivemos altas conversas. A maioria da região e de muçulmanos shiitas, e quando contei que tinha ido a Mashaad e falei sobre os Imams foram ao delírio. Não acreditavam como eu podia saber a historia da religião deles. Foi muito divertido!
Andamos pelas ruas caóticas descolamos as barracas e sacos de dormir e estávamos prontos para partir. Nosso motorista colocou sua musica favorita, que repetia “Ali, Ali, Ali…” e cantamos empolgados. Mal sabíamos que ele ia repetir a musica umas 50 vezes, ate enjoarmos. Passamos por lago, mais postos de controle e subíamos sem parar. De repente, parecia ser mais um passe, aonde depois de uma subida viria uma descida, tudo mudou. Chegamos nos Deossais, estávamos a 4 mil metros de altitude, mas em vez de um descida, um planalto! Andamos por pequenas trilhas, atravessamos rios ate chegar em um rio com uma ponte suspensa. Era o lugar onde acamparíamos.
Infelizmente estavam construindo uma ponte de concreto ao lado, o que fazia o lugar perder um pouco do estilo. Sem contar que estava cheio de acampamentos dos operários Mas de qualquer maneira o lugar era super calmo, bonito, e quando veio a noite, um céu espetacular!!!
A quatro mil metros de altitude a temperatura despencou rapidamente. Tínhamos sacos de dormir bons, mas as barracas emprestadas eram furadas, e tivemos que colocar grampos de roupa e fita para fechar os buracos. Quando chegou a hora de partir o jipe não funcionou. Tivemos que esperar mais algumas horas, ate a temperatura subir o suficiente. Se Deosai já estava bonito, depois de passarmos por mais rios, e outros lagos ainda mais bonitos, iniciamos uma descida com um suuper visual. Passamos por vilas e mais vilas. Estávamos sem mapa, mas nosso motorista foi pedindo informação e conseguiu chegar onde queríamos, Tarashin.
Estávamos muito na duvida se vinhamos para cá ou se íamos para os Fary Meadows. Ambos sao na base do pico Nanga Parbat, o oitavo maior do mundo. No Fary M., face norte, alem de alugar outro jipe, teríamos que caminhar três horas ate o local onde dormiríamos Diziam ser mais bonito, ou pelo menos mais verde. A maioria das pessoas vão para la. Mas a face sul, a Rupal face, tinha um apelo maior (literalmente). Era o maior paredão de um campo base ate o cume, com mais de 4500 metros.
Não nos arrependemos. A vila tinha só duas pousadas, sem energia elétrica e claro. Já tinha um baita paredão bem de frente para os nossos quartos, mas sabíamos que não era o cume que estávamos avistando. Teríamos que contornar a montanha. Acordamos cedo, e logo estávamos atravessando nosso primeiro glacial, rumo a vila de Rupal. Só um amontoado de casas, muitas plantações e mulheres com roupas coloridas. As mulheres não conversavam conosco, nem deixavam tirar fotos. Já os homens eram super simpáticos, nos convidavam para chá, e teve um Sr. que ate colheu umas verdura para nós.
A caminhada apesar de longa, não era difícil, pois era quase totalmente no plano. A Bibi nos acompanhou desta vez e adorou. Teve toda esta questão cultural antes de chegarmos ao acampamento base. O paredão nem parecia tao alto, mas tínhamos perdido a referencia. Tentando calcular com proporções e analisando melhor, vimos que grandes construções eram migalhas ao lado da montanha. Fizemos piquenique olhando aquela pequena pastagem com yakes, escutando os estalos seguidos de avalanche. Ainda sob o efeito da perda de perspectiva, decidi andar sozinho ate um glacial. Parecia perto, mas demorou um bom tempo. As flores, a neve branca e o barulho da montanha davam uma sensação fenomenal. Logo vi que poucos metros dali tinha outro glacial, que escorria da montanha e passava bem atras de onde estava o pessoal.
Na volta, passando pelas vilas, a Bibi ficou um pouco mais para trás para ver se melhorava a interação com as mulheres. Deu certo!! Foi cercada, perguntavam mil coisas, cantaram, pediram para ela cantar. Eu tentei tirar fotos de longe, mas era um momento para ser curtido, não fotografado. Depois de muita insistência para ficar, ela partiu. Crianças foram seguindo ela ate nos encontrarmos. O entardecer ja chegava, e paramos no glacial para pegar gelo. Pratica comum. As pessoas vem com uma sacola, limpam a parte de cima do gelo, quebram pedaços para levar para casa. Quem precisa de geladeira?
Depois de 13 horas estávamos de volta, tomando uma coca gelada com gelo do glacial. Durante a noite não dormimos, fomos desligados! Recuperados, estávamos prontos para seguir viagem. Lá estávamos nos, cedo para pegar o jipe comunitário ate Astor.
Caminho pelo vale de Astor e muito bonito e chegando lá tivemos uma surpresa. Sempre estavam sendo super honestos a respeito dos preços, não tínhamos nem que nos preocupar. Desta vez o motorista resolveu cobrar o famoso “preço para turista” (primeira e unica vez no Paquistão, 10 vezes o combinado). Acabei com ele! Iniciei com um “vc vai cobrar mas caro de nos por sermos estrangeiros? Este não foi o preço combinado então e roubo. Vc vai nos roubar em pleno mês sagrado do Ramadan???” Nisso ja juntou varias pessoas, todos dando opiniões Terminei apontando para o céu e dizendo “ Alah esta vendo. Será que somos diferentes de vc ou somos todos iguais?” A multidão que tinha se formado me apoiava e pressionou ate o motorista ceder todo envergonhado.
Mais um ônibus desta vez bom, ate com ar condicionado (ok, não funcionava direito) e voltamos para Gilgit, onde encontramos amigos suíços que não víamos desde o Uzbequistão.
Seguir pela KKH ou sair do caminho novamente? Tínhamos uma decisão a tomar.
Gui suas fotos são de chorar de lindasssss…as fotos dos manos sopranas e a da Bibi conversando com as mulheres paquistanesas só perde pra vc levitando ..rsrsr
As historis sao D+
bjs
Achei o maximo as fotos neste blogg. Hunza realmente é lindo. Sem contar que vive o povo que dura mais anos no planeta. Homens que chagm a durar 120 anos. A principal alimentação é o Kifir yogurte de leite produzido por bacterias). O povo huzar é o povo mais hospitaleiro que podemos conhecer.
Valeu! Bonitas fotos.
Luiz
Obrigado pelo elogio das fotos!!
Realmente fantastico o lugar e as pessoas tambem estao na nossa lista de mais hospitaleiras!!
E quem nunca foi tem coragem de falar mal do paquistao…
abs
Prezado Gui, parabéns por tão belo post. Há anos li o mais famoso livro sobre o Povo Hunza (O Segredo de Saúde dos Hunzas) e sempre evitei procurar saber ser haviam mudado seu modo de vida, a ponto de contraírem as doenças que temos por aqui. Hoje, sem querer, li um artigo que me deixou muito triste. Felizmente, consegui disfarçar minha tristeza e ninguém do escritório percebeu. Felizmente chorei “pra dentro”, tendo aquela sensação amarga de lágrima descendo pela garganta. Busquei então por informações recentes e encontrei seu post, que me gerou confiança e expectativa. Por favor, gostaria de saber se esses irmãos de tão longe conseguiram preservar sua identidade, saúde e alimentação e se tem notícias recentes deles. Muitíssimo obrigado e parabéns pelos textos e fotos. Sérgio Leite (Pai, Orquidófilo, apaixonado pelo Planeta Terra e apaixonado pela vida).
Oi Sérgio,
Obrigado pelo elogio. A região é inspiradora.
Recebem turistas, principalmente montanhistas ,há bastante tempo, mas tem conseguido preservar sua cultura. Um lugar fantástico!!
Abraço,
Fiquei feliz com sua resposta. Bom passeio pelo mundo. Se um dia quiser fazer um passeio mais simples (risos), te acompanho no Parque Estadual da Cantareira, na zona norte de São Paulo/SP, a maior reserva urbana de Mata Atlântica do Brasil, onde costumo ir nos finais de semana para recarregar minhas baterias.. Abraços e obrigado. Sérgio Leite
Adorei abrir esta página, lendo os costumes e hábitos dos Hunza me apaixonei, alimentação maravilhosa, saúde e bom viver com qualidade!
Oi Neoraci,
realmente eles tem um estilo de vida bem longe da modernidade!! A matéria que saiu naquela revista é um pouco sensacionalista, mas não deixa de ter promovido este povo fantástico!
Abraço
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